quinta-feira, 30 de abril de 2009

Capas de 30 de Abril de 2009


O título invisível

Mais do que os resultados, mas sem os desconsiderar, mais do que os jogadores que ajudou a valorizar, mas sem os esquecer, uma coisa que realmente sobressai na caminhada de Jesualdo em relação à de outros treinadores que também ganharam e formaram jogadores no FC Porto é a quantidade de rótulos que foi descolando: começou com o rótulo de benfiquista, prosseguiu com o de treinador defensivo, depois houve o rótulo de não passar dos oitavos-de-final da Liga dos Campeões. Por cada camada da cebola que se foi descascando, renovou-se a desconfiança. E é também isso - mais do que o tabu em si, que desconfio não passar de folclore - que justifica a curiosidade de rever essa matéria junto dos adeptos. No fundo, é um convite a ler as duas páginas aqui em baixo. À boleia do contrato, chegou-se a uma espécie de acto de contrição. Há quem se penitencie com humor, mas há também, tomando a liberdade de interpretar o que disse Pôncio Monteiro, uma mensagem do género: "Professor, veja lá se não se esquece de descolar um rótulo que falta, o de não ganhar finais". Da Taça...

Hugo Sousa n' O Jogo.

Todos com Jesualdo

Adeptos, personalidades e internautas querem a renovação de Jesualdo Ferreira. Agora ou só no final da época, pouco importa, porque há consenso no essencial: o professor deve continuar. Entre adeptos mais ou menos ilustres e quase 80 por cento dos participantes no inquérito online de O JOGO, a resposta é a mesma. Os dados não são científicos, mas a verdade é que espelham o estado de espírito actual. Ao contrário do que acontecia no passado, já não há grandes dúvidas sobre a qualidade e o mérito de Jesualdo Ferreira. Isso sente-se no estádio - há muito que os adeptos se renderam - e comprova-se também nos depoimentos recolhidos ontem. Neste jogo de opiniões, houve mesmo quem tenha reconhecido uma mudança radical no discurso: admitem que primeiro torceram o nariz e agora dão-lhe mérito pelas vitórias, mas sobretudo pelo trabalho que desenvolveu no clube, especialmente ao longo desta temporada. Este ano falta, no entanto, o carimbo dos títulos. O campeonato está próximo, mas ainda não está garantido; na Taça de Portugal, há mais um adversário para ultrapassar, o último antes da primeira vitória de Jesualdo na prova. O mais curioso acaba por ser isso mesmo: desta vez, a empatia com o treinador não parece tão dependente dos títulos propriamente ditos. E será também por isso, pelo menos aparentemente, que a renovação de contrato não foi oficialmente anunciada. Para os responsáveis da SAD, assim como para Jesualdo Ferreira, não haverá pressa em resolver o assunto, até porque primeiro há dois títulos para conquistar. A maioria dos adeptos ouvidos por O JOGO encara com naturalidade esse facto.

Esta fé em Jesualdo Ferreira deve-se a vários aspectos. Na opinião dos inquiridos, o mais importante são as vitórias: o treinador venceu os dois últimos campeonatos e prepara-se agora para conquistar o terceiro, para além de ter realizado uma excelente campanha na Liga dos Campeões. Mas não é só. Elogia-se também o crescimento de muitos jogadores ao longo desta época - Cissokho, Rolando, Fernando, Hulk... -, para além dos constantes recordes que tem batido. Jesualdo Ferreira já conseguiu ultrapassar, a título de exemplo, o número de triunfos consecutivos de José Mourinho fora de casa - sete em 2003/04 -, estando agora a perseguir a marca de António Oliveira - 11 triunfos como visitante em 1996/97. Aos muitos recordes, Jesualdo espera juntar mais um: a primeira dobradinha. Talvez depois disso apareça a tão desejada renovação...


Tomaz Andrade, Carlos Gouveia, Pedro Marques Costa n' O Jogo.

Cartão-postal do País

1 Quem se ausentou para o estrangeiro nos últimos tempos verificou, com tristeza, que o tradicional cartão-postal do nosso país sofreu uma radical alteração. As tintas das descrições e apreciações mudaram de cor. No lugar do sol chamejante, do mar do sonho da nossa errância e peregrinação pelo mundo, da beleza das paisagens, da culinária de fazer crescer água na boca e da afabilidade das pessoas, surgem diariamente no panorama mediático, notícias de um país sombrio, minado pelo à-vontade da desvergonha e corrupção, com referências desprimorosas aos nossos governantes. A imagem dada é a de uma terra sem rei nem roque, de um saque, festim e conluio de interesses e promiscuidades entre famílias, oligarquias, corporações e sociedades claras e ocultas, de uma coutada onde medram e gozam de subido estatuto habilidosos, espertalhões e passarões poisados nos vários ramos do poder. Ao lado ou acima destas ilustres figuras há cavalheiros que, com legitimidade e espartano porte, chamam a atenção para os desmandos e o naufrágio; mas falta à sua voz autoridade moral, porquanto a hipotecaram ao avalizar a montagem de negócios com laivos de podridão e ao dar aos seus autores a capa da protecção. O regime democrático vive o estertor, sem ter chegado verdadeiramente a vingar, por ter caído no fosso da imundície e degradação. Os políticos são vistos como actores de um circo sem nobreza e elevação; só cuidam de se arranjar e servir, não mostrando pelo bem-estar geral apego ou paixão.
Acredite o leitor, estas palavras não brotam de um ânimo leve; são o retrato do País que corre além fronteiras. E o pior é que não se trata de exagero, mas da fotografia nua e crua de uma realidade que, por mais que nos desgoste e surpreenda, ultrapassa de longe o conhecimento que dela temos. Há muitas mais coisas fétidas e vis que se escapulam do nosso olhar. Porventura aqui nunca as veremos, nem tampouco serão reveladas; para as perceber é preciso mirar, lá de fora, o esterqueiro que cresce cá dentro, mesmo debaixo do nosso nariz.

2 Foi isto que me confrangeu e doeu à flor da pele e nas dobradiças e entranhas do corpo e da alma, durante a recente ausência do País. Em contraste com este monturo asfixiante e nauseabundo da vida pública nacional e da chafurdice que a perfaz, surgiu um outro cartão postal, colorido com termos de admiração e exclamação, exaltando a nossa infinda capacidade de transcendência e superação. Esse cartão tem a marca Porto, que é, afinal, a raiz da origem de Portugal e constitui a referência para a esperança na grandeza do seu destino.

Porto é muito mais do que uma cidade; é bandeira e símbolo maior da sublimação do nosso país em todo o mundo, através da generosidade e espírito do vinho, da obra de internacionalização da universidade e da gesta de um clube de futebol. Este não se dá bem com a mesquinhez e pequenez e teima em se afirmar e seguir o seu curso entre os maiores, lavrando com ambição, ousadia, esforço, suor e visão um caminho que aos parceiros indígenas e à Liga da sua organização devia suscitar apreço, louvores e inspiração, em vez de lhes despertar inveja, aversão e perseguição. O nome Porto evoca orgulho e dignidade, é uma lufada de ar fresco e um raio de luz no cenário feio de ridículo e troça que, lá fora, se faz da bagunça do Portugal actual.

Sim, estava no estrangeiro quando o FCP saiu da Liga dos Campeões pela porta grande. Por isso pude ler e ouvir comentários opostos aos do quadro sujo em que é emoldurada a baderna da política, da justiça, dos media, das iniquidades, mentiras e fraudes, dos abusos e esbulhos, dos fretes e tráfico de favores, da nossa assombração e desilusão.

É neste Porto de revolta que me revejo e é também nele que ergo e bebo a taça do amor infindo ao Portugal eterno, da minha afeição e devoção. É ele que pede respeito para o primeiro-ministro, pelo simbolismo da sua função presente; e para todos os cidadãos honrados, pela seriedade permanente e pelo exemplo de uma vida limpa e decente.

Jorge Olímpio Bento n' A Bola.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Capas de 29 de Abril de 2009

Avaliação do professor

"Tenho um ponto de vista claro daquilo que é um profissional. Ele é avaliado pelo seu trabalho e por aquilo que consegue produzir. E, portanto, entendo que essa avaliação tem de ser feita de uma orma séria, de uma forma entendida por todos e aceite por toda a gente". A afirmação é de Jesualdo Ferreira. Foi proferida antes do jogo com o Setúbal a propósito da sua renovação de contrato com o FC Porto, esclarecendo o seu ponto de vista sobre o assunto e demonstrando uma inabalável confiança nas suas capacidades. Porque não há muitos treinadores que aceitem ser avaliados "à posteriori" por aquilo que produzem, especialmente os que não produzem grande coisa. E, depois, porque admitir que essa avaliação deve ser entendida e aceite por todos, significa que não deve permitir ambiguidades. Dizer que, esta época, já conquistou uma equipa, ganhou 18 milhões de euros na Liga dos Campeões e projectou uma mão-cheia de jogadores jovens para uma dimensão europeia pode não chegar para convencer toda a gente. Mas, ganhar o terceiro título consecutivo e juntar-lhe a Taça de Portugal não deixará dúvidas a ninguém e é esse o desafio que Jesualdo Ferreira aceitou: convencer toda a gente.

Jorge Maia n' O Jogo.

Jesualdo? Tem bom gosto!

Pinto da Costa abordou ontem, pela primeira vez, a possível continuidade de Jesualdo Ferreira no comando técnico da equipa durante a próxima temporada. O presidente do FC Porto aproveitou a cerimónia de apresentação do novo patrocínio nas camisolas da equipa de futebol - Super Bock - para fazer um jogo de palavras sobre o assunto, apesar de ter tido o cuidado de não desfazer o tabu. Para melhor se contextualizar, segue-se a pergunta feita sobre a eventual renovação de Jesualdo, introduzida numa conversava sobre o novo contrato celebrado com a Unicer. Aqui vai: "Gostaria que fosse Jesualdo Ferreira a orientar a equipa com este novo patrocínio nas costas da camisola?" Da resposta, e por entre a habitual ironia característica de Pinto da Costa, até se podem tirar algumas pistas. A primeira, de que Jesualdo "tem bom gosto", até por ter afirmado recentemente que gostaria de continuar no clube. "Eu não sei o que é que ele bebe, mas sei que é uma pessoa de bom gosto. Ainda há pouco tempo disse que gostava de continuar no FC Porto, e tenho a certeza de que é cliente da Super Bock. Nas costas, pode ser ou não ser, mas no estômago é de certeza", referiu o presidente portista, que conseguiu, com esta tirada, arrancar gargalhadas de uma plateia composta maioritariamente por responsáveis ligados ao FC Porto e à Unicer. O certo é que, e para além dos gostos pessoais de Jesualdo Ferreira sobre bebidas, ficou-se também a saber que Pinto da Costa recebeu com agrado as recentes palavras do treinador sobre a possível continuidade do clube. Mas voltou a tentar-se saber mais sobre o assunto. Sem efeito. Na segunda investida, a resposta foi diferente. A pergunta também, porque foi mais directa: "Jesualdo vai continuar?" "Estamos aqui para falar da Super Bock e do contrato que acabamos de assinar. Esse tipo de questões não são apropriadas ao momento". E assim se fechou o assunto.

FRASES

"Eu não sei o que é que ele bebe, mas sei que é uma pessoa de bom gosto. Ainda há pouco tempo disse que gostava de continuar no FC Porto, e tenho a certeza de que é cliente da Super Bock"

Pinto da Costa, 28 Abril

"Se gostaria de estar aqui no próximo 25 de Abril? Sim. Mas sei que um profissional é avaliado pelo seu trabalho e, portanto, entendo que essa avaliação tem de ser feita de uma forma séria e entendida por todos"

Jesualdo Ferreira, 25 Abril


NÚMEROS DE JESUALDO FERREIRA

2

Jesualdo Ferreira encontra-se no terceiro ano ao serviço do FC Porto - com boas possibilidades de conquistar campeonato e Taça de Portugal -, onde já venceu dois títulos de campeão.

3

O treinador do FC Porto prepara-se para disputar frente ao Paços de Ferreira a sua quarta final. Nas três anteriores - duas Supertaças e uma Taça -, perdeu sempre para o Sporting.

2

Os quartos-de-final da Champions são a melhor marca do professor. Pelo meio, garantiu por duas vezes consecutivas o primeiro lugar da fase de grupos da Liga dos Campeões.

Pedro Marques Costa n' O Jogo.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Capas de 28 de Abril de 2009


Tenham juízo

Há várias teorias sobre o que significa aquele gesto que Lisandro faz agora, cada vez que marca um golo, o mesmo gesto que repetiu duas vezes no domingo, apontando com o indicador direito para a cabeça. A minha teoria, tão válida e tão falível como qualquer outra, é relativamente simples: Lisandro está a dizer-lhes para terem juízo. A quem? Escolha o leitor. Pode ser aos responsáveis pela Comissão Disciplinar da Liga que o puniram por alegadamente ter simulado uma grande penalidade no jogo com o Benfica. Pode ser aos irresponsáveis que lhe chamaram batoteiro a reboque da mesma decisão peregrina apenas para agradar à populaça. Pode ser a Luisão, que há um par de semanas dizia que o mesmo lance estava "a valer um campeonato". Pode ser aos adversários que já arrumaram com Hulk e que ontem tentaram arrumar com ele. As hipóteses são quase ilimitadas e talvez seja por isso que Lisandro ainda não identificou o destinatário do gesto: é para toda a gente e não é para ninguém.

Jorge Maia n' O Jogo.

Crónica de um crime anunciado

O próximo jogador do FC Porto a ser posto fora de combate vai ser o Lisandro López. Porquê? Ora, basta ter visto o FC Porto-Vitória de Setúbal de anteontem para o perceber: porque ele é, neste momento, o mais influente e decisivo jogador da equipa e porque, na ausência do Hulk — já devidamente arrumado — transformou-se agora no alvo a abater pelos defesas contrários. Como, ao contrário de comentadores de outras áreas clubísticas, não tenho uma visão sistematicamente conspirativa do que acontece no nosso campeonato, não digo nem penso que a pancadaria que o Hulk foi levando até ser posto fora do campeonato e a que o Lisandro já começou a levar seja um serviço encomendado. Mas o que sei é que faltam quatro jogos e, sem o Lucho, o Hulk e o Lisandro, os quatro pontos de vantagem do FC Porto sobre o Sporting parecem curtos e o campeonato pode ficar reaberto. E, pese à boa imprensa que alguns deles têm, eu — e as bancadas do Dragão — sabemos bem que aquele é o pior banco de suplentes de que há memória: Stepanov, Tomás Costa, Andrés Madrid, Guárin, Mariano, Fárias, todos juntos não valem um jogador médio. Por isso, e apesar de o FC Porto entrar agora num ritmo de competição em pé de igualdade com Benfica e Sporting, a coisa já esteve mais desanuviada.
Bem pode o Paulo Bento fazer-se de desentendido e dizer a aleivosia de que os árbitros não têm de estar mais atentos a que um grande jogador possa jogar do que um jogador banal (como se alguém se preocupasse em arrumar um mau jogador…). A verdade é que, se em lugar do Hulk, tem sido o Liedson a ser arrumado pelo Ney, a esta hora já ninguém suportava ouvir o Paulo Bento. Porque, como ainda este fim-de-semana se viu contra o Estrela, não fosse o génio do Liedson, e o Paulo Bento estava a ver o título e a Liga dos Campeões por um canudo. Assim, confortado pelo facto de o Liedson, apesar de também decisivo, não ter sofrido uma única falta durante o jogo (assim como o Ney, não cometeu uma única falta…), confortado com três pontos muito pouco justificados no futebol apresentado, Paulo Bento lá se permitiu mais uma das suas cenas de histeria contra todos e contra o mundo em geral, porque o árbitro (bem ou mal, nunca percebi se há regra ou não), deixou que o Estrela cobrasse um livre sem apitar e da cobrança do livre — graças ao desatino do Rui Patrício e dos centrais — o Sporting esteve à beira de ver fugir dois pontos ao minuto 90. E o Paulo Bento lá saíu do campo, como é seu hábito, a esbracejar, a invectivar o juiz-de-linha e sem sequer olhar o treinador adversário enquanto o cumprimentava, a ver se assim disfarçava o constrangente facto de o Sporting ter acabado um jogo em Alvalade e contra os «amadores» do Estrela, enfiado na sua grande área, a defender de pontapé para a frente, a magra vantagem conseguida pelo talento de Liedson.

Aconteceu, aliás, em Alvalade, uma das melhores arbitragens a que já assisti neste campeonato, sem a menor razão de queixa, de parte a parte. Mas o público de Alvalade assobiou, de princípio a fim e como é seu hábito, todas e cada uma das decisões do árbitro contra o Sporting, e acabou a gritar «gatuno»por causa do tal livre que lançou o pânico na defesa do Sporting e nas bancadas do estádio. Como alguém escreveu há dias, o único árbitro que eles não contestariam era o próprio Paulo Bento. Não sei se é assim que esperam ganhar campeonatos, mas é assim que esperam ganhar a lenda: mentir, tantas e tantas vezes, até que se crie a ideia de que a mentira é verdade. Não inventaram nada.

Entretanto, o que eu sei é que uma comunicação social que foi capaz de passar uma semana a discutir como escândalo do mês a mão do Raul Meireles em Coimbra (numa vitória, todavia, dilatada e de mérito indiscutível do Porto), passou, como facto menor, sobre a maneira científica como o tal Ney mandou o Hulk para os balneários, no jogo da Taça, na Amadora, a meio da semana. E se houve crime anunciado foi este! Há meses que se percebia que o desfecho teria de ser assim: à medida que Hulk foi crescendo e explodindo, de jogo para jogo, à medida que a sua velocidade e o seu poder fisico começaram a encaixar na qualidade técnica, fazendo dele o «caso» do campeonato, tornou-se cada vez mais evidente que a fórmula pré-estabelecida de o travar era à pancada. E ele foi aguentando, aguentando, caindo e levantando-se, até chegarmos ao vergonhoso espectáculo de Guimarães, sobre o qual aqui escrevi então. Em Guimarães, logo ao minuto primeiro, o Hulk arrancou, deixou um, dois, três adversários para trás e, quando ia a isolar-se na área para o golo, levou uma trancada tamanha, que não era apenas para travar a jogada, era para intimidar e deixar marcas. Como era o minuto um, o árbitro nada fez, senão assinalar a falta. E os jogadores do Guimarães, claro, perceberam a mensagem: é fartar vilanagem! Seguiu-se uma autêntica, desenfreada e impune caça ao homem, até que Jesualdo Ferreira percebeu que mais valia tirar o desgraçado do Hulk do jogo do que perdê-lo para o resto do campeonato. Mas apenas adiou a sentença quinze dias: na Amadora, repetiu-se o processo desde o princípio e bastaram dez minutos para que a época estivesse acabada para um dos melhores, se não o melhor jogador deste campeonato. E o árbitro, uma vez mais, magnânimo: nem vermelho, como se impunha, nem sequer amarelo — apenas uma ligeira advertência ao jogador, do tipo «é pá, não dês muitas mais dessas, se não tenho de te mostrar um cartão e eu detesto isso».

E este fim-de-semana, lá estava o árbitro em actividade e o Ney a jogar em Alvalade e a portar-se como um cordeirinho. Só o Hulk é que, azar, só volta para o ano! Já vi este filme há dois anos, no Dragão, quando o Katsouranis teve uma entrada assassina sobre o Anderson, partiu-lhe a tíbia e o peróneo, rompeu-lhe os ligamentos do joelho, arrumou com ele seis meses, e o inefável Lucílio Baptista assistiu a tudo a dois metros de distância e achou que aquilo não valia nem um amarelo. E a seguir foi o Lisandro e a história repetiu-se, tal qual. Mas, desde que os «azarados» sejam jogadores do FC Porto, a quem é que isso incomoda? Preferem é continuar a alimentar a lenda de que jogador violento só há o Bruno Alves. Pois, mas o Bruno Alves fez agora quatro jogos de seguida na Liga dos Campeões sem cometer uma única falta e, não sei porquê, está na lista de compras dos principais clubes europeus, à frente de qualquer outro jogador português (deve ser por ser violento…).

Já aqui elogiei o Paulo Bento, como treinador, e, por isso estou à vontade para dizer que as suas declarações a propósito da lesão do Hulk foram lamentáveis. Lamento que alguém que faz carreira no futebol e que foi jogador muitos anos, quando, confrontado com a lesão do Hulk, em lugar de se fazer de desentendido e aproveitar para, mais uma vez, investir contra moinhos de vento, não tenha tido o fair-play de dizer isto. «É uma vantagem para nós, que não desejávamos. Um dos melhores jogadores do campeonato foi afastado por uma entrada de um adversário, que não é admíssivel. Se tivesse sido com um jogador meu, eu estaria justamente indignado». Mas parece, infelizmente, que esse espírito é demais para certos espíritos. E depois queixam-se os sportinguistas de que não há público em Alvalade nem militância no clube. E, se amanhã partirem uma perna ao Liedson, ainda haverá menos. Mas, olhem, no Dragão há público. Mesmo que a gente saiba que, por cada um que é abatido em combate, não há , nesta equipa, nenhum suplente minimamente capaz de lhe tomar o lugar.

Miguel Sousa Tavares n' A Bola.

domingo, 26 de abril de 2009

Golos de hoje



Liga Sagres - Porto vence

FCPorto 2 - Vitória de Setúbal 0.

Hóquei em Patins - Porto vence

FCPorto 1 - Benfica 0.

Capas de 26 de Abril de 2009


Jesualdo quer ficar mais um ano

Conferência de imprensa de Jesualdo Ferreira n' O Jogo:

"Onde é que estava no 25 de Abril?" A pergunta costuma ser esta, mas, ontem, Jesualdo ouviu-a de maneira diferente - "Onde conta estar no 25 de Abril do próximo ano?" Foi uma maneira de abordar a renovação que tarda e que ainda é assunto tabu. O treinador lá foi dizendo que, por ele, continua no FC Porto...

Jesualdo Ferreira cedeu, pela primeira vez, à tentação de manifestar a sua vontade de continuar no FC Porto, na próxima época, ele que até aqui tinha remetido - e continua a fazê-lo de resto - o processo da sua continuidade para uma análise feita pelas pessoas competentes, numa altura própria para tal. Mas ontem, o técnico confessou, se calhar um pouco timidamente até, mas disse que sim, que gostaria de continuar no FC Porto na próxima época, uma novidade que não deixou de alicerçar no óbvio.

Acha que para o ano estará aqui a falar connosco no 25 de Abril?

Para poder estar, tenho de estar vivo. É a primeira premissa. Se gostaria? Sim. Tenho um ponto de vista claro daquilo que é um profissional. Ele é avaliado pelo seu trabalho e por aquilo que consegue produzir. E, portanto, entendo que essa avaliação tem de ser feita de uma forma séria, de uma forma entendida por todos e aceite por toda a gente.

Mas não pode fazer uma auto-avaliação?

Ainda não acabou nada. No futebol, as avaliações são factuais. Para lá chegar são necessárias duas coisas importantes. Primeiro: os sócios do FC Porto querem ganhar tanto o campeonato como nós, se calhar mais. Grande parte dos profissionais que aqui estão não têm tantos anos de FC Porto quanto eles. Segundo: nos próximos jogos, em casa ou fora, temos de estar como em Coimbra, Manchester ou Madrid. Queremos ter os sócios connosco para estarmos em família, porque não somos muitos para superar as dificuldades que vamos ter pela frente.

Comemora o 25 de Abril de forma especial?

Sim. Era um jovem que lutava pelo que queria, não só sobre o ponto de vista político. Procurei seguir em frente. Por isso, em certas alturas, não abdico de nada. É capaz de ser verdade dizer que o FC Porto ganhou mais quando a democracia entrou no país. Dados são dados. Mas não vão pôr nada disso, não têm espaço [risos]. O que vai ficar? O que vão dizer? Sei o que vão escrever: "ele diz que o FC Porto ganhou mais em democracia". Todos os puros deste país, os moralistas, vão dizer assim: "Como é possível ele dizer isto?" Mas nunca fizeram a história disto; nunca perceberam. Entendem, mas não querem perceber.

O futebol português antes e depois do 25 de Abril de 1974 também mudou?

Quando estive aqui antes do último jogo falei de uma série de questões e veja a polémica que se levantou. Vai sempre tudo bater na mesma tecla. Há quem queira entender e há quem não queira. Depois, ainda há os que entendem e não percebem, e também há o contrário. Um regime político, antes e depois, tem a ver não com futebol mas com História. Estamos sempre a fazer adaptações. A partir do momento em que a democracia permitiu que as pessoas discutissem mais, que tivessem mais capacidade para produzir liberdade para pensar e iniciativas para aprender, é natural que os quadros se alterem. Já passaram 35 anos, com alterações em todas as áreas da sociedade, e porque não no futebol também? A comunicação social informa aquilo que lhe dizem e aquilo que vê. A Imprensa será sempre algo extremamente poderoso para se fazer passar aquilo que se quer. Antes do 25 de Abril quem eram os clubes que ganhavam? E depois? Têm a resposta, porque perguntam?

Fica contente com estas notícias de alegado interesse em jogadores do FC Porto?

Fico preocupado. Gostaria que não me levassem a equipa toda antes de acabar o campeonato e a Taça. Há uma grande diferença entre aquilo que é a vida do clube e a vida dos jornais. A vida do clube é tentar ter um grupo fechado, porque é importante, para trabalhar bem, ter o grupo imune a pressões exteriores. A vida dos jornais é tentar saber notícias para vender mais. Muitas vezes, os interesses dos jogadores não são os dos treinadores, que gerem o colectivo, e os jogadores têm as suas próprias posições. O negócio exterior do futebol muitas vezes colide com aquilo que são os interesses de uma equipa

Mas há alguma verdade nestas notícias?

Isso é a vida da minha equipa, não tenho de a divulgar.

E o Orlando Sá, confirma? O Braga já o fez...

Quem confirmou?

Jorge Jesus...

No meu tempo, era o presidente. Se o Jorge Jesus o confirmou, por aqui tem de ser o FC Porto, através dos canais próprios. No FC Porto, quando um jogador é contratado, há quem tenha a função de o divulgar. A minha é a de falar sobre os jogadores que o FC Porto tem. Isso tem que ver com contrato definitivo. Não sou eu que os faço, pois não? Se essa pergunta fosse feita ao Ferguson, tinha cabimento; aqui no FC Porto, não.

Paulo Bento ficou sem resposta

Acha que o Paulo Bento percebeu mal as suas palavras em relação à arbitragem?

Não vou comentar essas questões objectivamente. Para mim, é importante que uma equipa jogue de forma séria, que os jogadores respeitem os árbitros, o público e a profissão de que vivem. A forma que eu entendo é não permitir, porque não gosto, que os meus jogadores se atirem para o chão, embora isso aconteça; que discutam com os árbitros, às vezes isso acontece; que joguem de forma agressiva para além daquilo que é tacticamente importante. Se verificarem os cartões amarelos e as ausências por expulsão dos jogadores do FC Porto, se verificarem o número de faltas quer na Champions, quer no campeonato, percebem que esses são conceitos que temos. E nessa perspectiva, entendo que a protecção que se deve fazer aos jogadores está em linha directa com as exigências de quando se joga a um nível elevado. Não se trata de diferenciar ninguém, trata-se de proteger o jogo, obrigando os jogadores a serem competentes para se exprimirem da forma mais correcta, garantindo que o jogo seja atractivo, tenha mais público e seja um negócio com impacto. De uma forma geral, as pessoas entendem, mas não querem perceber. E não tenho de perder tempo com essas questões.

Para o jogo com o Setúbal, que expectativas?

Não há adversários ideais, há adversários que têm as suas capacidades, mas há, acima de tudo, um FC Porto que quer ganhar e que entende que este jogo com o Setúbal é o mais importante e o mais difícil que temos no nosso horizonte. O Setúbal é uma marca que temos de respeitar por aquilo que fez até hoje no futebol português. Recordo que é um clube que nos habituou a ter grandes equipas onde aparecem bons jogadores, com grande talento. Por razões que se prendem com aquilo que é a realidade do nosso futebol, o Vitória de Setúbal passa por dificuldades. Nós respeitamos o clube, a equipa e as dificuldades dos seus profissionais. Mas a nossa missão, enquanto profissionais, é fazer um jogo sério e ganhar. No trajecto do FC Porto, este jogo é tão importante como outros, mais mediáticos, com adversários mais poderosos.

A equipa tem trabalhado com os mesmos índices de motivação, apesar das ausências de Lucho e de Hulk?

Ficamos tristes quando os jogadores se lesionam. A nossa missão enquanto treinadores é proteger os jogadores, dar-lhes condições para recuperarem rapidamente e fazer perceber à equipa, porque foi esse o nosso processo de trabalho, que é sempre a equipa que terá de resolver as questões dos jogos e não as individualidades. A partir do momento em que o Lucho se lesionou, e agora o Hulk, as questões deixaram de ser da equipa e passaram a ser das individualidades, e não é esse o nosso processo. É uma realidade neste momento, mas não vivemos do passado, há que fazer o que é necessário com os jogadores que temos, que sempre considerámos serem competentes para jogar no FC Porto.

O jogo da Amadora foi um aviso para a equipa e para o que resta da temporada?

Não se trata disso. Passámos a eliminatória, que era um dos objectivos, mas perdemos e não gostámos de ter perdido. O jogo não foi aquilo que queríamos. Mesmo que tivéssemos ganho ou empatado, não teríamos gostado do jogo. Não serviu de aviso. Na Amadora, o FC Porto utilizou uma série de jogadores que, no seu contexto de equipa e ao longo do tempo, têm tido menos competição, mas que foram capazes de entrar forte e de fazer um golo. Têm de perceber que o FC Porto saiu um pouco do jogo a partir desse momento e ainda controlou até à lesão do Hulk. Mas quem está no futebol, quem vive essas pressões por dentro, tem o sentimento de grupo e de balneário, quem sofre com esses acidentes, percebe o que isso significou. Às vezes, são factores motivadores que fazem com que as equipas ainda cresçam mais, mas, naquele caso, não o foram.

sábado, 25 de abril de 2009

Capas de 25 de Abril de 2009


Protecção total

Paulo Bento perguntou ontem se apenas os jogadores talentosos merecem ser protegidos pelos árbitros e acrescentou a essa dúvida uma outra: se aos outros, aos menos talentosos, se podem partir as pernas. É claro que não. Não se podem partir as pernas a ninguém e quem o fizer deve ser punido severamente pelos árbitros. Se os jogadores mais talentosos são uma preocupação em particular é porque, como gostam de ter a bola nos pés por saberem o que fazer com ela, são vítimas fáceis dos sarrafeiros que não olham a meios para os travar. Partir pernas, rasgar ligamentos ou provocar entorses não pode fazer parte do arsenal à disposição de nenhum jogador e se faz, não pode merecer a complacência dos árbitros e nisso imagino que estejamos todos de acordo. Finalmente, concluir que o facto de o FC Porto se queixar da falta de protecção aos "melhores executantes" seria uma espécie de apelo à violência sobre os restantes é tão abusivo como, por exemplo, imaginar que, quando Paulo Bento pede para não ser prejudicado pelas arbitragens, no fundo pretende que tal prejuízo recaia sobre os outros.

Jorge Maia n' O Jogo.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Capas de 24 de Abril de 2009


Tanto bate até que fura

Era mais ou menos inevitável que Hulk fosse lesionado com gravidade. Da mesma forma como foi mais ou menos inevitável que, a seu tempo, Anderson fosse lesionado com gravidade. Entre as duas lesões, separadas por mais de duas temporadas, manteve-se em comum, inalterável, a tolerância dos árbitros em relação à violência exercida dentro do relvado sobre os jogadores mais talentosos do futebol português. Jesualdo Ferreira já tinha avisado que Hulk era vítima de abusos constantes por parte dos adversários perante a complacência dos árbitros e quem teve oportunidade de seguir a maior parte dos jogos do FC Porto esta temporada só pode surpreender-se pelo facto de não ter acontecido antes. Aliás, Carlos Xistra na quarta-feira e Lucílio Baptista há dois anos não só deixaram que Hulk e Anderson fossem lesionados com gravidade como nem sequer acharam pertinente qualquer tipo de sanção disciplinar para os respectivos carrascos, permitindo-lhes concluir que, tal como eles já suspeitavam, o crime compensa. E como compensa, vai voltar a praticar-se em breve, num relvado perto de si.

Jorge Maia n' O Jogo.

Lapsos e apaixonados

DEPOIS da injusta eliminação europeia, o FC Porto não se deixou abater. Fez, em Coimbra, o suficiente para manter a liderança, com quatro pontos de avanço e a vantagem nos jogos disputados com o Sporting.
A cinco jornadas da meta não há razão para grandes preocupações, mas é conveniente não facilitar porque tudo pode ainda ser posto em causa. Aliás, a pressão opinativa ainda é grande, como se viu esta semana.

É verdade que o FC Porto beneficiou de um erro da arbitragem, numa situação tão pouco usual e desnecessária que nem Meireles conseguirá explicar. Aliás, se o lapso tivesse sido de um jogador da Académica, já se andava a desconfiar da verdade desportiva. Como a bola ficou à mercê de um academista, que só por inépcia não marcou um golo fácil, pergunto-me se Olegário Benquerença não terá aplicado, ainda que indevidamente, a lei da vantagem, que não é válida no caso de penalty mas que serviu para que, no caso da falta de Reyes sobre Lucho, no Dragão, toda a gente desculpasse essa jogada e se concentrasse na alegada simulação de Lisandro nesse mesmo jogo.

Para os profissionais da suspeita, contudo, há sempre dois pesos e duas medidas. Felizmente, o Benfica ganhou e até goleou, o que nos poupa a maiores dramatizações. Mas, ao contrário do que aconteceu com os leixonenses, ninguém pôs em dúvida o empenho dos setubalenses, apesar da pesada derrota e da forma como ela se começou a desenhar.

Essas coisas só são suscitadas quando envolvem um potencial benefício do FC Porto.

É por isso que o erro de Olegário é tratado como escândalo mas, em contrapartida, o Sporting se queixa da arbitragem em Guimarães, onde o apaixonado do apito poupou Derlei a uma expulsão e precisou de ajuda para assinalar a falta de Carriço que ocorreu nas suas barbas.

Rui Moreira n' A Bola.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

27 anos de Pinto da Costa à frente do FCP

Longe vão os tempos em que o património do FC Porto se resumia ao Estádio das Antas, à sede na Avenida dos Aliados e a um autocarro em adiantado estado de decomposição. Era esse o panorama quando Pinto da Costa assumiu a presidência, em 1982, tinha o clube 60 mil sócios e 170 mil contos de passivo. Hoje os números são, naturalmente, diferentes (os sócios pagantes são 90 mil e o passivo é de cerca de 153 milhões de euros!), tal como a realidade do clube é outra. Com Pinto da Costa, o FC Porto trilhou o rumo da modernização, que se traduz em "pormaiores" como o pioneirismo na publicidade nas camisolas e, nos últimos cinco anos, com a renovação das instalações

27 anos de presidência >> A data é assinalada com a inauguração do Dragão Caixa por Pinto da Costa, que dedicou os tempos mais recentes a engrandecer as infra-estruturas do FC Porto (Olival, Dragão e Vitalis Park), sem esquecer os títulos.

Num mundo quase totalmente subjugado à ditadura dos números, em particular aqueles que são manejados pelos economistas e que ditam o futuro de nações e indivíduos, a vontade de alguns homens ainda pode fazer a diferença. Para lá dos argumentos de natureza financeira, que porventura desaconselhariam tal empreendimento, o FC Porto deverá ter mesmo o seu museu. E não porque se preveja poder retirar daí rendimentos significativos - o mais provável será até o contrário -, mas porque é essa a vontade de Pinto da Costa. Ainda em Novembro passado o presidente dos dragões reiterou essa sua promessa, quem sabe venha a tornar-se no mote do próximo mandato, tendo em conta a orientação estratégica do clube nos anos mais recentes. Mesmo deixando de lado os incontáveis títulos conquistados nas mais variadas modalidades desde 23 de Abril de 1982, se a quantidade de cimento servir para medir a obra de alguém, então a de Pinto da Costa só pode ser considerada grandiosa. E hoje, com a inauguração do Dragão Caixa, a nova casa das modalidades colectivas, fecha-se o círculo das infra-estruturas desportivas, depois do Centro de Treinos do Olival, do Estádio do Dragão e do Vitalis Park. O museu, cujo projecto até existe e é da autoria do prestigiado arquitecto Alcino Soutinho, autor do Centro de Treinos do Olival, poderá ser a cereja em cima da obra notável de Pinto da Costa, a qual perdurará por gerações, tanto no cimento como na memória. Tal como as incontáveis taças ganhas sob a sua liderança, que assim passarão também a ter uma casa com o traço de modernidade característico às demais.

João Araújo n' O Jogo.

Capas de 23 de Abril de 2009


Entrada muito dura de Ney, sem direito a amarelo

Entrada muito dura de Ney, sem direito a amarelo

Em velocidade, Hulk deixou Nuno André Coelho no chão, cruzando para o interior da área de Filipe Mendes, o que acaba por conseguir. Porém, no segundo seguinte é atropelado por Ney, que foi à dobra, ficando no chão agarrado à perna esquerda. Teve de sair de maca e talvez não jogue mais esta época.

Não ir na onda dos enganos

A crise está aí, com garras bem afiadas. Não se vai embora, seguindo os conselhos dos oráculos que atiram para cima dos ombros dos cidadãos em dificuldades a obrigação de a driblar. Veio para ficar.
Certamente compete a todos perguntar o que cada um pode fazer para ajudar a mandá-la dar uma grande curva. Ora isso obriga a reflectir acerca da abundância de discursos, lamúrias e medidas acerca dos efeitos, sem tocar nas suas causas e factores, a não embarcar e ir na sua onda. Porventura fazendo de conta que vamos, mas indo sempre do outro lado, nem que ele pareça ser o de fora.

Em todos os locais podemos e devemos agir contra a crise. Ensinando a dedicação ao trabalho, o apego emocional às instituições, o sentido e espírito de corpo, a gratificação nos resultados duramente alcançados, o envolvimento pessoal num ambiente de labor porfiado. Colocando as relações e conexões diante das desagregações, a serenidade diante do frenesim, a cultura diante da frivolidade, a profundidade diante da superficialidade, as convicções diante das tentações, os princípios e valores diante dos interesses e manhas, a humildade diante da arrogância, a probidade e sensatez diante da agitação e estardalhaço, a perseverança diante da desistência, a filosofia diante da imbecilidade, a substância diante da vacuidade, a espiritualidade diante da futilidade, a dignidade diante da baixeza, a superação diante da resignação, a simplicidade diante da presunção, a sinceridade diante da falsidade, a verdade diante da mentira, a nobreza diante da vileza, a essência diante da aparência, a civilidade diante da venalidade, a responsabilidade diante da leviandade, a força da firmeza diante da cedência à fraqueza, o estudo diante da preguiça, a disciplina e o esforço diante da folia e do carpe diem, o brio e pundonor diante do abandono e desleixo, a procura diante da sorte, o mérito cimeiro diante do nivelamento rasteiro, o conhecimento diante da ignorância, a dúvida diante da certeza, a admiração diante do pasmo, a discrição diante da exibição, a correcção diante da simulação, a luz diante da escuridão, a liberdade diante da servidão, a autonomia diante da dependência, a sanidade diante da demência, a sabedoria diante da irracionalidade, a lucidez e a decência diante da ligeireza e maledicência, o carácter diante da habilidade, a tranquilidade diante da deriva, a legalidade diante dos jeitos, os deveres diante dos direitos, a modéstia diante da vaidade, o comedimento diante da excentricidade, a alvura diante da sujidade, o trigo diante do joio, as normas e regras diante do regabofe e laxismo, a frontalidade diante do calculismo, a verticalidade diante do oportunismo, a ética e deontologia diante do relativismo, a autenticidade diante da hipocrisia, a lealdade e fidelidade diante da traição, a amizade diante da intriga, a rectidão diante da esperteza, a palavra corajosa diante da cobardia ardilosa, a honradez e integridade diante da desonestidade e imoralidade, a sensibilidade diante da brutidade, a solidariedade diante da indiferença, a humanidade diante da animalidade.

Mas... é necessário tudo isto? Não vejo outra solução. Ademais não nos basta a esperança, por ser um sentimento ambivalente. Pode brotar dela o optimismo para ultrapassar a tristeza e a desgraça do presente e para confiar na vinda de um futuro risonho. Mas pode, do mesmo jeito, convidar ao conformismo e comodismo, à demissão e passividade, à aceitação daquilo que nos aflige, a não agir, a esperar e a entregar-se à lotaria do que há-de vir, sem nos mobilizarmos activamente para vencer o que nos afronta e buscar o que nos falta.

Neste Abril de crenças traídas, de tantas ilusões perdidas e criaturas estupefactas ou adormecidas, procuremos a elevação e altura e não o abaixamento e rasura. Como disse Nietzsche, devemos fugir do gorduroso odor ao estábulo, isto é, da manada, a sete pés. Para não nos deixarmos contaminar. Corramos, pois, atrás do espírito de Abril, contra a manipulação e alienação, o adormecimento e aviltamento, a indolência e a sonolência.

Jorge Olímpio Bento n' A Bola.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Taça de Portugal - FCP na final

Estrela da Amadora 2 - FCPorto 1: conjunto das duas mãos: 2-3.

Capas de 22 de Abril de 2009


Isto está uma desbunda

Conferência de imprensa de Jesualdo Ferreira

n' A Bola:

O JOGO com o E. Amadora representa mais uma etapa rumo à dobradinha, uma vez que o FC Porto também lidera o campeonato?
— Esta é apenas mais uma etapa para chegar à final da Taça de Portugal. Vamos à Amadora para ganhar a eliminatória, sem esquecer que temos uma vantagem de dois golos e que este é um jogo que vale precisamente por golos e não por pontos.

— A perspectiva de vencer Campeonato e Taça colocam-no na linha de dois históricos treinadores portugueses, José Maria Pedroto e José Mourinho, que tiveram esse sucesso pelo FC Porto. É reconfortante saber disso?

— Ainda não cheguei lá, não ganhámos nada. Deus queira que isso aconteça mas ainda é muito cedo, aguardemos pelo final da época, antes de tudo queremos chegar à final da Taça e depois temos mais cinco jogos para sermos campeões.

— O adversário do FC Porto parece um pouco mais vulnerável nesta fase da temporada...

— Vou responder com honestidade: é natural que isso possa acontecer. Mas não posso esquecer as dificuldades que tivemos para ganhar na Amadora para o Campeonato, temos muito respeito pelos profissionais daquela equipa e muito respeito por esta competição.

— Como se motiva uma equipa que pouco depois de defrontar o Man. United chega à meia-final da Taça de Portugal com dois golos de vantagem?

— A motivação nunca foi problema no FC Porto. Para alcançar os objectivos temos de jogar nos limites, não temos direito a falhar.

— Fucile pode voltar a jogar imediatamente?

— Está convocado e isso é um bom sinal. É muito importante para nós chegar a esta fase da temporada e ter todos os jogadores em condições de ajudar a equipa, com excepção do Lucho.

— Haverá muitas alterações na equipa em relação aos últimos jogos?

— Vão jogar aqueles que podem garantir o melhor rendimento, as minhas escolhas são sempre determinadas por isso. Temos de correr e ter atitude séria e competitiva.

— O E. Amadora passa por grandes dificuldades financeiras mas o problema é extensivo a outros clubes. Não teme que o futebol português possa desmoronar, que o futuro esteja em risco?

— O futebol português chegou ao momento em que as grandes decisões têm de ser tomadas. Se serão, não sei, não tem havido trabalho de antecipação quando a estratégia passa por montar as coisas antes delas aconteceram. Em Portugal não se antecipa nada, reage-se depois de surgir o problema quando devia acontecer o contrário.

— Então, não é apenas a questão salarial a estar em causa.

— Onde estão as soluções para as fracas assistências, para a pouca qualidade de jogo? Temos 15 horas de programas semanais na televisão sobre futebol e 80 por cento das discussões são parciais sobre a arbitragem. Eu não vejo todos esses programas, porque não posso nem quero, mas fala-se desses temas com uma parcialidade... A discussão não é feita sobre o essencial, discute-se o supérfluo, portanto as coisas não avançam.

— Está a querer dizer que a vitória do FC Porto em Coimbra foi beliscada devido ao lance com a mão por Raul Meireles dentro da área?

- Está a ver...é um dos exemplos que quero dar. Essa é que é a discussão, é o descalabro, a desbunda. Só se fala disso e fala-se com um à-vontade e uma parcialidade que quem ouve não pode encarar as coisas a sério. Não sei se há volta a dar, eu não irei fazê-lo de certeza, os responsáveis é que têm de fazer isso. Discutimos coisas fúteis, o essencial não é discutido, a Imprensa é que pode dar a informação às pessoas do que se passa. Eu não sei o que se passa nos gabinetes dos ministros, no de Obama... A Imprensa tem vindo a dar informações, não intervém no que são as ideias sobre os problemas do futebol português.

n' O Jogo:

Os salários em atraso do Estrela serviram de ponto de partida para uma conclusão preocupante de Jesualdo Ferreira: estratégia, no futebol português, só mesmo dentro do relvado. Fora dele, é o descalabro total, porque, diz, ninguém pensa nos problemas concretos. Depois, como se não bastassem as preocupações sobre os salários, as fracas assistências ou a calendarização deficiente, só para citar alguns, o treinador apontou o dedo aos comentadores. Comentam tudo, essencialmente arbitragem, percebam ou não. O resultado é o futebol que temos.

Vai defrontar uma equipa que tem salários em atraso e, longe disso, não é caso único em Portugal. Estas questões preocupam-no? O futebol português pode estar em risco?

Em Portugal, temos por norma nunca antecipar nada. Somos reactivos; reagimos às coisas. Normalmente, não reagimos pelos melhores caminhos, porque nunca pensamos no problema. Não direi que seja em todas as áreas. As coisas acontecem, reagimos e nem sempre acertamos. O futebol português chegou a um momento em que as grandes decisões têm de ser tomadas, e acredito que não irão ser. Porquê? Porque nada está feito para trás, não há trabalho de casa. Medidas avulso não resolvem nada. Estou a dizer isto e não me refiro a ninguém em especial. É que também estou metido no futebol. Digo isto com a segurança de que muitas coisas aconteceram e ninguém as antecipou. As grandes evoluções fazem-se quando se antecipa o que pode vir a acontecer. A estratégia monta-se antes de as coisas acontecerem.

Então e agora, não há volta a dar?

Volta a dar? Não sei. Eu não a darei, seguramente. Os responsáveis estão a ver se conseguem. Mas, que está mal, está. Curiosamente, continuamos a discutir coisas supérfluas do jogo, coisas que têm um interesse relativo. O essencial não é tratado. Mas isto faz parte de nós, da nossa forma de viver e de estar. A Imprensa - e, quando me refiro a ela, digo que se trata do veículo que pode dar às pessoas a informação do que se está a passar, porque as pessoas não sabem o que se passa nos gabinetes da presidência, dos ministros ou do Obama - é um factor fundamental, não só do que é o conhecimento como a projecção de qualquer solução. A Imprensa tem vindo a dar informações que entendemos serem credíveis, tanto em discurso directo como em informações paralelas, mas quais são as ideias sobre os problemas do futebol português? Não estou a dizer que a Imprensa é interventiva ou que faz doutrina. Onde estão as soluções? Já as escreveram? Já lhes propuseram algo? A questão é esta: não há trabalho de casa e não há estratégia futura. Não estou a ficar fora deste problema. Tento fazer o melhor, tal como os jogadores e tal como os dirigentes. Toda a gente tenta fazer o melhor, mas não vejo nenhuma estratégia que resolva o problema da pouca assistência, da qualidade do jogo, dos calendários, do negócio do futebol, da seriedade com que as coisas são entendidas, que dê capacidade para a Imprensa se voltar para aquilo que é o jogo e não para as coisas secundárias. Para terminar, temos 15 horas semanais de programas sobre futebol na televisão, para além dos jornais, e garanto-vos que 80 por cento das discussões sobre arbitragem são parciais. Dizem o que viram e o que não viram. É esta a discussão do futebol. Façam as contas e vão às grelhas televisivas, vejam as horas que estão no ar e as audiências. A grande discussão não é sobre o essencial, e, como não é assim, as coisas não avançam. Há uns anos, a discussão era a mesma...

A propósito, sentiu que a vitória do FC Porto em Coimbra foi beliscada?

Está a ver? Cá está lançada a questão normal. Não vejo todos os programas, porque não posso e porque às vezes não quero, mas é essa a discussão do futebol português há anos e anos. Actualmente é a desbunda. É um descalabro, toda a gente a falar do mesmo. Só se fala disso [ de arbitragem ] e o que é mais grave é que se fala destes temas com à-vontade, com uma facilidade e um conhecimento das situações inacreditáveis. Fala-se com uma parcialidade que ninguém encara as coisas a sério. É esta a realidade.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Capas de 21 de Abril de 2009


Males proverbiais

A minha vizinha do lado tem o estranho hábito de se expressar usando quase exclusivamente provérbios mais ou menos populares. Digo mais ou menos populares porque tenho de confessar que não conheço metade deles e imagino que alguns sejam inventados na hora, mas o facto é que tem um para cada situação e muitos até se negam mutuamente: se às vezes "quem espera sempre alcança" há outras em que "quem espera desespera". O mais frequente, contudo, tem qualquer coisa de conformismo tipicamente judaico-cristão e diz que "há males que vêm por bem". Usa-o quase sempre nas conversas sobre o tempo com que eu, desajeitado, tento abreviar as viagens que partilhamos no elevador. Lembrei-me dela e dele, do provérbio, ontem, quando me apercebi que Fucile falhou 12 jogos desde que saiu lesionado frente ao Rio Ave. Uma dúzia de partidas que Jesualdo Ferreira aproveitou para transformar esse problema na oportunidade para afirmar Sapunaru e Cissokho no onze titular, transformando uma das principais debilidades da equipa - os laterais - num dos seus mais fortes argumentos. Lá está. Há males que vêm por bem. O problema são os outros.

Jorge Maia n' O Jogo.

A ressaca

1 No FC Porto, há muito tempo que não há vitórias morais. Ali, joga-se sempre para ganhar e, quando se perde, perde-se: ninguém fica a consolar-se com a injustiça, a falta de sorte ou os erros de arbitragem. É este espírito, antes de tudo o mais, que marca a diferença de resultados entre os «azuis e brancos» e a restante concorrência a nível nacional. E é por isso que a eliminação às mãos do Manchester United — por mais injusto que o desfecho nos pareça, atendendo ao que se passou nos dois jogos — é uma derrota e ponto final. Não é o fim de um «sonho», como se escreveu, porque, verdadeiramente, o sonho nunca existiu. Mas foi o fim de uma hipótese, ténue e incrível, de ter afastado da mais importante competição mundial de clubes o campeão em título e mais rico clube do mundo. Para que isso acontecesse, era preciso, porém, dois momentos, dois jogos, de absoluta perfeição de todos, de uma tamanha competição e eficácia competitiva que as mais valias individuais do todo poderoso MU não conseguissem sobrepor-se a um jogo de equipa perfeito. Era preciso que o guarda-redes não falhasse nada que pudesse ser defendido, que a defesa fosse quase impenetrável, o meio-campo incansável e que o ataque não desperdiçasse golos possíveis. Isso não aconteceu, nem lá nem cá: lá, o FC Porto teve o adversário aos pés, mas, erros próprios (um golo oferecido e dois falhados, daqueles que não se podem desperdiçar) impediram uma vitória que teria resolvido logo a eliminatória; e cá, um fantástico pontapé de Ronaldo (que não deixou de ser um golo consentido por Helton, no primeiro remate à baliza dos ingleses), mais um desperdício de Lisandro e outro de Rolando, a par do «síndroma de Mamede» e dos efeitos devastadores da ausência de Jesualdo no banco e de Lucho no campo, ditaram uma vitória «científica» do MU, com um amargo sabor a «quase». Viu-se uma equipa absolutamente impecável na defesa (face a um ataque de meter terror), um grande meio-campo, mas depois falhou o ataque, jogador por jogador, e, uma vez mais, se demonstrou como a ausência de um guarda-redes fiável limita a equipa nos grandes jogos (não foi só o golo de Ronaldo, foi também a única outra oportunidade do Manchester, num pontapé dentro da pequena área e na sequência de um canto, com uma bola a pingar a um metro da baliza, que nenhum guarda-redes pode deixar de interceptar).
É verdade que a festa que os campeões do mundo fizeram no final e o ar de evidente alívio de sir Alex ficaram como sinal do respeito e temor que o FC Porto conseguiu impor ao gigante europeu. Mas isso é uma vitória moral. Saímos com honra, sim, caímos de pé, sim; mas saímos e caímos. Apenas com a convicção de que a equipa foi tão longe, ou mais ainda, do que era legítimo exigir-lhe. Não se pode ter sol na eira e chuva no nabal: vender o Anderson ao Manchester e depois ficarmo-nos a lamentar da sua decisiva acção a travar o nosso jogo a meio-campo. As coisas são como são.

2 De regresso à vidinha de todos os dias, aí temos o nosso campeonato, com as suas eternas discussões sobre arbitragem — que, ao que parece, é aquilo a que se reduz a apreciação do mérito do futebol que se vê. É verdade, sim, que ficou um penalty por marcar a favor da Académica, quando havia 0-0, no jogo contra o FC Porto. Mas também é verdade que um jogador da Académica, depois da mão na bola do Raul Meireles, ficou completamente isolado perante o Helton, com todas as condições para fazer golo e falhou: se tivesse marcado, conforme lhe competia, não havia discussão sobre o penalty. E também é verdade que o liner cortou uma jogada de golo do FC Porto por offside absolutamente inexistente e é verdade, sobretudo e para quem viu o jogo, que o FC Porto poderia ter vencido por cinco ou seis, se o Hulk, por exemplo, não estivesse a atravessar uma crise de forma e de crescimento. Só quem não entende nada de futebol ou quem esteja de má fé é que poderá sustentar que, sem aquele penalty não marcado, o FC Porto não teria vencido em Coimbra.

A ressaca da noite de quarta-feira não deve ter sido fácil de gerir, mas, com mais ou menos limitações e cansaço, mais ou menos inspiração e motivação, Jesualdo Ferreira conseguiu o suficiente para reerguer a equipa no caminho do que resta conquistar: o campeonato e a Taça de Portugal. Mais uma jornada passou e faltam só quatro vitórias até ao título de tetracampeão nacional.

3 O Vitória de Setúbal caminha para a segunda divisão e o Boavista caminha para a terceira. Não há milagres sem pão: não é possível manter a motivação dos jogadores nem o equilíbrio psicológico de uma equipa se os jogadores jogam sem receber e sem saber o que é o dia de amanhã. A excepção do Estrela da Amadora não passa disso mesmo e o que é preocupante é que possa haver dirigentes de clubes que olhem para o caso do Estrela como um exemplo de viabilidade desportiva dentro da anormalidade. É urgente que Hermínio Loureiro se defina na anunciada nova regra a entrar em vigor em Maio: ou é para ser finalmente a sério e sem olhar a quem, ou é para ser aplicada com «compreensão» e prolongar por mais um ano este indecente cenário dos clubes que competem sem pagar aos jogadores nem ao Fisco e Segurança Social. Afinal, isto é uma competição profissional ou uma quermesse?

4 Já começaram as notícias dos jogadores que desejam ardentemente ver-se com a camisola do Benfica para o ano que vem. Das extraordinárias vedetas que aí vêm rumo à Luz, tipo Fredy Adu ou Pablo Aimar. Já se preparam as manchetes de Verão, já se faz por esquecer os fiascos desta época com os anunciados triunfos da próxima. Nos «grandes» de Lisboa preparam-se eleições e, enquanto que no Sporting, o actual presidente se jura farto de desconsiderações e a mal resolvida oposição consta que prepara a candidatura de um ex-polícia a contas com a justiça, no Benfica o actual presidente já vai investindo forte e feio contra uns eternos e não nomeados ambiciosos que podem ter o desplante de lhe querer disputar o lugar. Eis um problema que não se põe no FC Porto.

Enfim, já cheira a «defeso», já há espuma e maresia no ar, já se anuncia o Verão. Mais um ano que acaba, mais sonhos que morrem e se enterram e outros que nascem e se alimentam de novas ilusões. O ciclo do futebol segue ao lado e próximo do ciclo da vida. E sempre gostei disso.

Miguel Sousa Tavares n' A Bola.

sábado, 18 de abril de 2009

Capas de 18 de Abril de 2009


Mariano sem rótulo

Para além de ter credibilizado Sapunaru e Cissokho, a eliminatória com o Manchester confirmou ainda um Mariano irreconhecível. Para melhor, evidentemente. A imagem que lhe era associada de forma automática, a vaguear cabisbaixo pelo campo sempre que perdia um lance, parece agora ultrapassada. É verdade que continua a errar, mas já o faz de cabeça levantada, o que é novidade. O golo em Guimarães, o que marcou em Manchester ou a forma desinibida como encarou a responsabilidade de substituir Lucho são pontos favoráveis que obrigaram o público do Dragão a reconsiderar. Mariano foi sempre um dos mais castigados pelos assobios, justificados pelas asneiras, mas também pela apatia que evidenciava. Justiça lhe seja feita: nunca escondeu que estava mal. Aliás, achava sempre obra do acaso as vezes que acertava. O problema é que essa frontalidade com que encarava os jornalistas não batia certo com a postura amedrontada em campo. Justiça lhe seja feita outra vez: está mais incisivo, fazendo tudo para descolar o rótulo de caso perdido. O público ainda desconfia, porque descolar rótulos é um processo demorado. O próprio Jesualdo, que nunca desistiu de Mariano, sabe disso...

Hugo Sousa n' O Jogo.

Pinto da Costa apresenta pavilhão

Pinto da Costa vai revelar hoje os primeiros detalhes sobre a inauguração do pavilhão do FC Porto, numa conferência de imprensa marcada para o final da manhã, no Estádio do Dragão. O presidente do FC Porto estará acompanhado por José Araújo e Silva, administrador da Caixa Geral de Depósitos, que é o parceiro do clube na construção do Dragão Caixa. Recorde-se ainda que a inauguração oficial do novo espaço azul e branco está agendado para o dia 23 de Abril.

Já ganhámos sem Lucho

Conferência de imprensa de Jesualdo Ferreira n' O Jogo:

Jesualdo Ferreira surgiu concentrado no próximo objectivo do FC Porto, que passa pela conquista do campeonato. Apesar de, em consequência do jogo da segunda mão dos quartos-de-final da Liga dos Campeões com o Manchester United, os azuis e brancos terem perdido Lucho, operado anteontem ao joelho esquerdo. O técnico sublinhou a importância do argentino na equipa, mas foi dizendo nas entrelinhas que havia soluções no grupo de trabalho para colmatar a ausência do médio, desdramatizando-a, ao ponto de lembrar que o FC Porto já ganhou sem Lucho noutras alturas - O JOGO reproduz o quadro de jogos de campeonato sem o argentino. De qualquer forma, Jesualdo deixou bem vincado que a deslocação a Coimbra não será um passeio e que a equipa terá de estar ao seu melhor nível para vencer um adversário que ainda só perdeu uma vez em casa esta temporada, com o Benfica.

De que forma é que a ausência de Lucho poderá afectar a equipa daqui em diante?

É a equipa e o seu colectivo que vão resolver essa questão.

Há espaço para ganhar coisas sem Lucho?

Não, não há espaço para ganhar coisas sem o Lucho. O que há é uma equipa que foi capaz, em alguns momentos deste campeonato e desta Champions, de ganhar jogos sem o Lucho. O Lucho, como qualquer outro jogador deste plantel, tem um peso muito grande dentro da equipa, mas a equipa sempre foi capaz, e vai continuar a ser, de jogar colectivamente e conseguir resultados que também conseguiu com ele. Não se vai inferir aqui que estamos a menosprezar a sua importância, não é nada disso. Mas nunca ganhamos com um jogador, mas como equipa.

Mas há outros jogadores com mazelas do jogo com o Manchester, como o Rodríguez, ou o Sapunaru. Está a contar com eles para a Académica?

Neste momento, dão todas as garantias de que poderão estar em condições. Faltam 48 horas, portanto só amanhã [hoje] é que decidiremos em definitivo sobre os jogadores convocados, mas não há nenhum elemento que diga que possam estar fora do jogo.

Que jogo espera frente à Académica?

Difícil. Esta época, a Académica só perdeu em casa com o Benfica. Este jogo vai exigir do FC Porto o mesmo nível de rendimento que teve noutros jogos de elevado grau de dificuldade. A equipa foi capaz de sair de alguma tristeza que teve pelo facto de ter sido eliminada da Champions; está sólida, capaz e segura do seu valor, porque sente que tudo o que aconteceu não foi por incapacidade. O FC Porto vai com a determinação de ganhar. Sente que tem capacidade para o fazer e vejo, no trabalho, a força para chegar a Coimbra e lutar pelo resultado e pela vitória.

Quatro mil adeptos estão confirmados em Coimbra...

Isto significa a força do FC Porto, significa o orgulho que os adeptos têm no clube e na sua equipa, o crédito de confiança que temos e vamos jogar forte com ele. É o único crédito que temos; é a confiança nas nossas capacidades e a confiança de quem acredita em nós. Em nenhum momento deste trajecto deixamos de acreditar naquilo que somos capazes de fazer. Não há nada, nem ninguém, que nos possa perturbar naquilo que são os nossos objectivos.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Capas de 17 de Abril de 2009


Dois problemas

Jesualdo Ferreira tem dois problemas complicados para gerir nos próximos dias. Por um lado, há a inevitável frustração dos seus jogadores pela eliminação na Liga dos Campeões, amplificada pelas esperanças alimentadas pela excelente exibição e correspondente resultado no jogo da primeira mão e pelo equilíbrio que marcou a segunda partida frente aos campeões europeus e do Mundo. Voltar à terra depois de duas semanas a flutuar entre as nuvens pode ser uma experiência traumatizante especialmente quando a aterragem é forçada pela violência de um remate de Cristiano Ronaldo. Depois, há a ausência, ainda sem termo certo, de Lucho, capitão, melhor marcador da equipa e principal referência do meio-campo portista. Ainda que os últimos jogos tenham servido para Jesualdo Ferreira mostrar alternativas às opções mais habituais no onze e ainda que o FC Porto nunca tenha perdido para o campeonato sem Lucho, a importância do "Comandante" é incontornável e vai muito para além das evidências sublinhadas pelos números. Com o campeonato a entrar na recta final, estes são problemas que Jesualdo Ferreira tem de resolver com a urgência.

Jorge Maia n' O Jogo.

Sorteio colocou Fenerbahçe e Lyon no caminho dos dragões

O FC Porto ficou ontem a saber que vai defrontar Fenerbahçe e Lyon na Peace Cup. O maior torneio de clubes do Mundo conta ainda com Real Madrid, Sevilha, Juventus, Celtic, Liga de Quito, Seongnam, Aston Villa, Málaga e Al-Ittihad, que o sorteio repartiu ontem por três grupos e que prometem animar a época baixa do futebol europeu.

Mas a Peace Cup, que tem por objectivo contribuir para o desenvolvimento do futebol nos países mais desfavorecidos, atraiu alguns dos maiores clubes do Mundo graças aos seus prémios monetários, numa espécie de Liga dos Campeões em formato reduzido. Uma vitória na prova pode representar um encaixe de cerca de dois milhões de euros, suficientes para pagar os passes de jogadores como Rolando ou Guarín, por exemplo. O segundo lugar vale um milhão e os terceiro e quatro classificados arrecadam meio milhão cada um.

O torneio que decorre de 24 de Julho a 2 de Agosto vai levar o FC Porto - representado ontem por Vítor Baía e Urgel Martins em Sevilha - a defrontar o Lyon em Huelva, sede do Grupo D, a 27 de julho. Dois dias depois, em Sevilha, será a vez dos azuis e brancos medirem forças com os turcos do Fenerbahçe. A final está marcada para o dia 2 de Agosto em Sevilha, capital da Andaluzia, que este ano acolhe pela primeira vez a Peace Cup em solo europeu.

Durante o sorteio que decorreu em Sevilha, junto ao estádio que acolheu a final da Taça UEFA em 2003, em que o FC Porto derrotou o Celtic, várias foram as referências feitas a esse encontro, até porque, curiosamente, os dois clubes participam na Peace Cup e não estão livres de voltar a defrontar-se de novo. De qualquer forma, conforme deixaram escapar os organizadores, "o estádio terá um significado especial para o FC Porto". Por entre as personalidades presentes no sorteio, destaque para Vicente Boluda, presidente do Real Madrid, Del Nildo, presidente do Sevilha e para dirigentes da Juventus e do Lyon.

D' O Jogo.

Muito mais que 18 milhões

Afinal, agora que o sonho da passagem às meias-finais terminou, o que ganhou o FC Porto com a Liga dos Campeões? Para Fernando Gomes, administrador da SAD do FC Porto e responsável pela área financeira do clube, a pergunta tem mais do que uma resposta certa, mas pode resumir-se numa frase: "Muito mais que os 18 milhões de que se tem falado nos últimos dias."

É um facto que o FC Porto arrecadou cerca de 18 milhões de euros em receitas directas, divididas em parcelas mais ou menos generosas: 5,4 milhões pela entrada directa na fase de grupos, a que se juntam 2,4 milhões correspondentes às vitórias sobre Fenerbahçe (2), Dínamo de Kiev e Arsenal, mais 2,2 milhões devidos pelo acesso aos oitavos-de-final que se somam aos 2,5 milhões do apuramento para os quartos. Junte-se dois milhões de "market pool" televisivo e três milhões de receitas de bilheteira e o total atinge os tais 18 milhões de euros, o segundo valor mais alto de sempre, atrás apenas das receitas garantidas pela conquista do título de campeão europeu em 2003/04. "Uma receita excepcional", confirma Fernando Gomes e que representa um aumento de seis milhões de euros em relação ao inicialmente previsto no orçamento para este ano.

Mas os proveitos que o FC Porto retira da participação na Liga dos Campeões, insiste o administrador, "vão para além disso" e são "difíceis de quantificar". "Não é fácil avaliar com exactidão a valorização que sofreram os nossos jogadores depois de estarem expostos naquela que é a maior montra do futebol europeu e Mundial, mais ainda quando foram capazes de demonstrar todas as competências técnicas que são reconhecidas nacional e internacionalmente", sublinha Fernando Gomes.

Uma valorização tanto mais significativa quanto o FC Porto fez alinhar na Liga dos Campeões uma equipa profundamente renovada, estreando nada menos que oito jogadores na principal competição do futebol mundial, todos com uma significativa margem de progressão para explorar durante as próximas temporadas. No contexto actual de crise e dificuldade de acesso ao crédito, o comportamento do FC Porto na Liga dos Campeões significa um importante balão de oxigénio para as finanças do clube, mas reflecte-se também ao nível do prestígio internacional do clube, abalado no início da temporada quando a participação dos tricampeões nacionais na prova chegou a estar em causa e recuperado através do comportamento desportivo da equipa.


Factos e números

Esta participação do FC Porto na Liga dos Campeões permitiu a estreia de oito jogadores que nunca antes tinham disputado a competição

A média de idades dos jogadores que se estrearam na Liga dos Campeões esta temporada com a camisola do FC Porto ronda os 22 anos

O FC Porto já arrecadou 18 milhões de euros em receitas directas da Liga dos Campeões, o valor mais alto das últimas temporadas e 6 milhões acima do previsto no orçamento para este ano.

Jorge Maia n' O Jogo.

Faltou qualquer coisa...

QUANDO, na véspera do jogo, lamentei a ausência de Jesualdo Ferreira no banco, por um inexplicável e platinesco castigo, e sugeri que se assobiasse o hino da Champions, o que, aliás, sucedeu, estava já muito preocupado. A equipa entrou em campo órfã de Jesualdo, e tudo se adensou aos 30 minutos quando ficou viúva de Lucho, o seu grande pensador.
Duvido que Jesualdo tivesse retirado Rodriguez quando era Hulk que não estava em campo, ou tivesse trocado Sapunaru por Tomás Costa quando era Meireles que já não aguentava a dupla função a que a lesão de Lucho o obrigara.

Confirmou-se que José Gomes não tem a qualidade de Azenha mas, mais do que as opções, o que me irritou foram as suas declarações no fim do jogo. Depois de tantos meses no Dragão, devia ter tido tempo para perceber que já não está na Luz e que os adeptos portistas não se contentam com vitórias morais.

É urgente que alguém lhe explique que este é o clube errado para quem se contenta com elas, e lhe diga que podemos sempre reclamar que nos ficou a honra, mas não podemos nunca invocar a glória quando perdemos.

O que se viu, na eliminatória, é que o FC Porto poderia ter ido mais longe, apesar das diferenças de orçamento. Teve à sua mercê o campeão de Inglaterra, da Europa e do Mundo e houve jogadores, como Fernando, Cissoko, Rodriguez, Sapunaru, Lisandro e Mariano que não mereciam ficar pelo caminho. Mas também se percebeu que faltou alguma coisa.

Faltou, pelo menos, um substituto para Lucho e, também, um grande guarda-redes. Helton é uma simpatia e chega para consumo interno, mas falhou ao lançar-se tarde. No futebol de primeira, os remates a 40 metros, desencobertos, por alto, sem ressaltos ou desvios, são sempre defensáveis. Foi pena, mas para o ano há mais.

Rui Moreira n' A Bola.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Capas de 16 de Abril de 2009


Ser mais outro que os outros

DEZ minutos depois da eliminação do FC Porto, escrevo sem conseguir fazer reparos ao tri (futuro tetra) campeão nacional. O Man. United segue em frente porque foi melhor, porque é melhor. Mas como teve de sofrer para o fazer... E bem pode agradecer a um português, Ronaldo, a única diferença entre duas equipas com orçamentos incomparáveis.
Antes do jogo, Cissokho, lateral-esquerdo do FC Porto que assinou exibição fantástica em Old Trafford, disse que ia defrontar Ronaldo como qualquer outro jogador. Na conferência de imprensa que antecedeu a partida, Jesualdo Ferreira justificou a frase com o respeito que todos os jogadores do United merecem. Não me pareceu que fosse isso que Cissokho queria dizer. Nem me pareceu que fosse necessário tentar justificá-la.

Na verdade, Cissokho tinha razão. O futebol é simples. Ronaldo tem muito talento, dois braços e duas pernas. E se não é, como disse o lateral, igual aos outros, é só porque é mais outro que os outros — faz bem as coisas bem mais vezes. O que fazer quanto a isso? Pouco ou nada. O que podia alguém fazer para parar um remate a 33 metros da baliza? Pouco ou nada. Quando o melhor do Mundo (que o foi em 2008, com justiça) consegue mostrar o seu futebol pouco mais há a fazer que admirar. E reagir. O FC Porto reagiu mais de uma hora. E nesse período Ronaldo foi mesmo como os outros, apenas um empecilho no caminho da vitória. O dragão não chegou lá, mas pode e deve estar orgulhoso.

Hugo Vasconcelos n' A Bola.

Palavras exigidas e preferidas

DIZEM-ME que as minhas palavras têm a forma de pedras aguçadas. E aconselham-me a não ser radical, sob pena de correr sérios riscos. Eu agradeço o reparo e aviso. Mas não consigo calar-me e fechar os olhos à desvergonha e cinismo das circunstâncias. Como carapaça agarrada à condição, trago comigo a sina de usar termos à medida do contexto.
Assim gosto de evocar o mérito, o suor, o empenho e dignidade. Amo o desporto e detesto a batota; aprecio a política e abomino a farsa. Subscrevo a definição de «trabalho» que vem nos dicionários económicos: «Esforço individual ou colectivo destinado a produzir um bem ou um serviço». Defendo a «democracia» por me lembrar que ela e o Estado existem por causa das pessoas, que estas são anteriores e criaram aqueles para o seu serviço e dignificação. Por isso recuso a corrupção, mas adiro à sua definição, elaborada pelo velho e sempre actual Aristóteles: «Alteração do estado das coisas, modificação e desvio de conteúdo, originando o desvirtuamento do homem». E também louvo a definição registada nos dicionários da nossa língua: «acto de apodrecer, de estragar ou desnaturar». O leitor por certo partilha o meu gosto e está farto de tapar o nariz ao intenso fedor que lavra no país.

Portanto gosto de palavras que nos incitem a repudiar a corrupção, a tomar a decisão de não permitirmos que ela faça parte do dia-a-dia, de não cairmos na indiferença, resignação, negligência e permissividade. Para não ficarmos podres, desvirtuados, desnaturados, putrefactos, nauseabundos. Eis porque aplaudo atitudes, medidas e palavras que combatam a fraude, o contrabando de influências, a promiscuidade, a hipocrisia, o servilismo, o lambe-botismo, o conúbio das oligarquias que medram com a pobreza e o sofrimento.

Nós somos criação de palavras e frases, até porque «no princípio era o verbo». Escolhamos, pois, as que criam o nosso bom-nome, elevação e honorabilidade. E actuemos de acordo com elas. Avivemos a inquietude, o alerta constante e a interrogação pronta. Alijemos o insuportável peso da despergunta que é timbre de acuados e medrosos, de bajuladores e outros infra-humanos.

Aqui e agora, obriguemo-nos a usar palavras cortantes como pedaços de vidro. As que expõem a revolta que nos consome, as traições que contra nós cometem, as mentiras, falsidades e petas que nos vendem, as farsas que para nós representam, a poeira imunda que nos atiram aos olhos. As que discordam, porque o facto de todos estarem de acordo não transforma o falso em verdadeiro. Ademais a sabedoria desalinha e tende a provocar discórdia; unânime é quae sempre a ignorância. Não há bom senso nas maiorias; caso contrário, teriam razão os milhões de moscas que poisam e vegetam em tudo quanto é dejecto e trampa.

Porque as palavras expressam o que ainda não somos ou não temos, deitemos fora as que ignoram as coisas elevadas e afundam no vazio e perda. Apeguemo-nos às que fazem sol de noite, acendem fogueiras na água, pintam de cores o orvalho, criam plantas no deserto. Usemos com firmeza as que mostram alguns indivíduos iguais a ratos de esgoto, baratas e insectos com propensão a escória e a habitar os desvãos da indecência. As que revelam as lesmas e afins que vegetam na lascívia do ínfimo e rasteiro e abrem caminhos de gosma com a sua conduta. As que apontam os parasitas e toda a casta de sanguessugas da nossa boa-fé, os trapos que resvalam para o nada moral.

Digamos palavras que quebram o silêncio dos ofendidos, falam por eles, são os seus olhos, erguem o chão até ao apogeu infinito e deste fazem matéria de ensino. São essas as da competência mais entendida e sábia em pessoas do que em livros, alicerçadas mais em inutensílios do que no utilitarismo e pragmatismo do quotidiano, mais inclinadas a louvar um poema do que a construção de uma central nuclear.

Nesta Páscoa ressuscitemos as palavras que tomam por gente comum os sujeitos inviáveis, os poetas da sensibilidade essencial, ética, estética e vertical. Elas reinventam o melhor que há em nós e se vai apagando e perdendo, por acção do tempo e corrupção dos seus agentes.

Jorge Olímpio Bento n' A Bola.