quarta-feira, 26 de maio de 2010

Entrevista a Rodriguez

"Não podemos estar dois anos sem vencer o campeonato"

Depois de uma primeira época de grande nível no FC Porto, Rodríguez realizou um segundo ano bastante irregular, muito por culpa das quatro lesões que o afastaram de parte significativa da temporada. Nesta entrevista a O JOGO, o extremo fala do passado e do futuro, dos incidentes no túnel da Luz, de Hulk, Falcao, Álvaro Pereira ou Guarín, mas também do principal objectivo para a próxima época: voltar ser campeão nacional. Tudo porque, segundo Rodríguez, um clube "tão grande" como o FC Porto não pode estar dois anos seguidos sem vencer o campeonato.

Que balanço faz desta temporada a nível pessoal e colectivo?

Foi uma época negativa, sem dúvida. Tive muitas lesões e foi frustante, apesar de saber que este tipo de situações pode acontecer. A nível colectivo também não foi positivo porque não conseguimos ser campeões e, neste clube, esse é sempre o primeiro objectivo.

Acha que o título do Benfica foi justo?

Não comparo equipas, olho apenas para o FC Porto, para a nossa equipa, e penso em melhorar mais todos os dias. Ficámos em terceiro lugar, penso que merecíamos mais; não perdemos este campeonato no campo, perdemos fora dele.

Considera que os incidentes no túnel da Luz foi um momento importante da época?

Eu diria mais: foi o momento determinante da temporada. Retiraram-nos dois jogadores que eram fundamentais para a equipa por situações que não aconteceram exactamente como algumas pessoas disseram. E castigaram-os sem necessidade nenhuma, porque o que se passou não justificava um castigo tão pesado.

Mas afinal o que aconteceu?

Foi uma grande confusão. Quando há muito gente naqueles locais, passam-se sempre muitas coisas, até pela emoção do momento… Apesar disso, nãoaconteceu nada de especial; foi uma confusão normal, com muita gente envolvida. Nada mais.

Se Hulk não tivesse sido castigado, o FC Porto teria sido campeão?

Com o Hulk, com o Sapunaru, com os jogadores que se lesionaram, com o Varela, Mariano... Aconteceram muitas situações difíceis para a equipa que se não tivessem acontecido, podíamos ter sido campeões. Agora, resta-nos esperar que a próxima temporada seja mais tranquila para chegarmos ao final no primeiro lugar, porque queremos voltar a ser campeões.

Por ter passado pela Luz, mas também por ser o maior rival do FC Porto, custou-lhe ver os festejos do Benfica?

Claro que custou, mas apenas porque no ano anterior tínhamos sido campeões... Foi uma festa linda, que vivi pela primeira vez, naquela que foi a maior experiência da minha vida profissional. Mas nem sempre se pode ganhar, todos perdemos um dia.

Concorda com a ideia de que um dos problemas desta época foi a integração lenta de alguns reforços?

Não sei se foi isso. É verdade que o FC Porto estava acostumado ao Lucho e Lisandro e era uma vantagem tê-los cá, porque foram dois jogadores fundamentais para o clube. Mas estou contente com os rapazes que chegaram: são profissionais e querem melhorar. Se esta época não conseguimos vencer, temos de esperar que a próxima seja melhor.

Esta época, ficou a sensação de que o FC Porto perdeu quase todos os jogos decisivos: Braga, Benfica, Sporting, Taça da Liga...

Perdemos com essas equipas, mas também lhes ganhámos. Quando eles vieram ao Dragão, vencemos com grande facilidade. Mas esse tipo de jogos são sempre muito equilibrados. O FC Porto é o melhor clube em Portugal e todos nos querem vencer, o que torna todos os jogos mais exigentes para nós.

Pinto da Costa já afirmou que quer voltar a vencer uma competição europeia. Acredita que o FC Porto pode conquistar a Liga Europa no próximo ano?

Acredito que sim. Este ano eliminámos o Atlético de Madrid na Liga dos Campeões e eles acabaram por vencer a Liga Europa. Para além disso, temos muita experiência na Champions e isso pode ser fundamental na próxima época. Vencemos jogos importantes fora, como com o Atlético de Madrid, e fizemos uma grande exibição em Manchester, por exemplo. Se juntarmos a experiência que temos com uma boa mentalidade, claro que podemos vencer.

Podemos então depreender das suas palavras que o FC Porto é um dos favoritos?

Favoritos são todos. É difícil afirmar isso dessa forma, porque no futebol nunca se sabe o que pode acontecer. Por exemplo, eu esperava fazer uma grande temporada e depois foi o que se viu. São coisas da vida, pequenos pormenores que podem mudar tudo.

Depois de não ter ganho o campeonato este ano, acha que no próximo a pressão vai ser maior?

Acho que não. Sentimos a pressão de ter que ganhar em todos os jogos; o FC Porto foi campeão nos últimos anos, e os jogadores habituaram-se a ter a obrigação de ganhar frente a uma da segunda divisão ou contra a melhor equipa do mundo. Por isso, estamos sempre pressionados para vencer. Vamos trabalhar para sermos novamente campeões, que é o nosso objectivo, e num clube muito grande como o FC Porto não se pode estar dois anos consecutivos sem vencer o campeonato.

Já conhecia Álvaro Pereira. Por isso pergunto-lhe se ficou surpreendido com a sua primeira época no FC Porto?

Não, de forma nenhuma. Já o conhecia da selecção, tal como o Fucile, e sabia que tinha muita qualidade. Ele sempre correu muito e estou contente por ele. Antes de o contratarem, perguntaram-me como é que ele era: eu disse que tinha muita qualidade e, como podem ver, não me enganei.

E já agora, estava à espera de tantos golos do Falcao no primeiro ano na Europa?

Já o tinha defrontado antes pela selecção e sabia que era um bom jogador. Fez uma grande época e, pelo que fez no FC Porto, merecia ter sido o melhor goleador do campeonato.

Não foi por um golo; em Leiria, quando marcou, podia ter-lhe passado a bola. Agora, quando olha para trás, ficou arrependido por não lhe ter dado o golo a marcar?

Não, não. Não me arrependo. Respeito sempre os adversários e se estou isolado em frente ao guarda-redes tenho que rematar. Imaginem que tinha tentado passar e errava o passe… Acho que o Falcao não ficou chateado, porque quando nos foi possível, tentámos jogar sempre para ele.

Hulk merece os elogios constantes que lhe fazem um pouco por todo o mundo?

Sim, sim. Ele é muito bom. Tem a força de um cavalo e uma qualidade fantástica. Já o demonstrou muitas vezes e espero que seja feliz, sobretudo depois do que lhe fizeram este ano, porque aquele castigo foi muito injusto. Até por isso, acredito que na próxima época vai ter um grande ano.

Apesar da "força de cavalo", como companheiro de equipa, não entende que ele devia ser menos individualista em determinados momentos do jogo?

O que eu posso dizer é o seguinte: se tivesse de defrontar o Hulk, ou fosse o treinador da equipa adversária, dava ordem para marcá-lo com muita atenção, porque ele é um jogador com uma enorme capacidade para desequilibrar os jogos. É muito difícil para os adversários, mas também para ele, porque, aqui em Portugal, já o conhecem bem e já encontraram a melhor forma de o marcar.

Como recebeu a notícia sobre a provável renovação de contrato com o Guarín?

Fico contente porque sempre soube que ele é um excelente jogador. Joguei contra ele na selecção de sub-20, mas também nas eliminatórias para o Mundial, mas só agora é que conseguiu demonstrar o seu valor no FC Porto. É a tal situação: o futebol é o momento e ele esteve muito tempo sem jogar; depois, quando jogou com mais regularidade, mostrou que é um grande jogador.

No final da última época, magoou-se na selecção e chegou cá lesionado depois das férias. Afinal o que aconteceu?

Tive uma lesão complicada no joelho, ao serviço da selecção, e depois fui de férias, porque as férias são para descansar. Regressei ao FC Porto lesionado, sentia dores, e não pude começar logo a treinar. Foi um período complicado, porque não consegui fazer a pré-temporada com os meus companheiros.

E que explicação encontra para as sucessivas lesões que sofreu durante o ano, quase todas musculares?

No ano passado não tive nenhuma lesão... São situações que acontecem. Num ano tudo corre bem, mas no seguinte nunca se sabe o que vai acontecer. Comecei mal e depois fui recuperando aos poucos, mas acabava por surgir sempre outra lesão. Foi complicado. Para mim, as pré-épocas são fundamentais e eu arranquei mal, numa altura em que os meus companheiros de equipa já tinham muitos treinos e alguns jogos.

As lesões foram o factor decisivo para uma época tão cinzenta?

A nível pessoal sim. Apesar disso, espero que não retirem o mérito do que fiz quando joguei, porque nesses momentos dei sempre o máximo em prol da equipa. Obviamente que não é o mesmo, porque regressava das lesões, começava a jogar, a ganhar ritmo e voltava a lesionar-me novamente.

Nunca se percebeu muito bem em que posição gosta mais de jogar? Médio ou extremo?

Na selecção jogo mais atrás, como médio-ofensivo, enquanto no PSG, Benfica e FC Porto fui sempre utilizado na posição onde jogo agora, que é aquela que gosto mais. Gosto mais de jogar como extremo.

Este ano vai fazer a pré-temporada. Sendo assim, pode prometer a melhor época de sempre para o próximo ano?

No final da última época, disse que este iria ser a melhor de sempre. Depois, aconteceu tudo o que se sabe. Por isso, agora é melhor ficar caladinho e esperar para ver o que acontece.

Uma das críticas que lhe fazem é que, para quem joga no ataque, marca poucos golos e tem poucas assistências...

Não concordo. Na última época fiz muitas assistências para golo, porque joguei com regularidade, ao contrário do que acontece esta época. Estou contente com o meu trabalho, treino bem todos os dias, e isso é o mais importante para mim. Respeito essa opinião, mas não concordo.

O FC Porto acabou a época a jogar num sistema com quatro médios. É a táctica ideal para si?

Posso jogar num sistema com quatro médios, mas para mim não muda muito. Na prática, apenas jogaria dez metros mais recuado.


Esta época falou-se de alguns problemas no balneário, inclusivamente uma troca de agressões entre Tomás Costa e Bruno Alves...

São situações que acontecem em todas as equipas. Por exemplo, hoje posso ter um problema com o Bruno, mas amanhã já estamos bem. Num grupo tão grande como é o caso dos plantéis de futebol, é muito raro passar-se uma época inteira sem acontecer situações desse género. É normal e não foi nada de especial.

Mas nos outros anos não se soube de nada…

Isso é culpa dos jornalistas…. Por exemplo, quando jogamos bem somos os maiores, mas quando jogamos mal somos lixo. Não é preciso ser assim. Os jogadores respeitam o trabalho dos jornalistas, mas entendemos que não somos respeitados da mesma forma. Claro que não queremos que digam sempre bem de nós, mas gostávamos que fossem mais justos, mais sensatos, porque todos temos família, amigos e temos de dar a cara às pessoas quando saímos à rua.

Depois de uma época complicada a nível pessoal, acabou por ficar de fora do Mundial. Sente-se frustado?

A vida é mesmo assim. Num momento estamos bem e a seguir podemos sair à rua e ter, por exemplo, um acidente de automóvel. No caso dos jogadores, as lesões são sempre momentos muito difíceis. Mas agora sinto-me bem, porque já estou totalmente recuperado.

Mas mesmo assim, acreditava que ia estar no Campeonato do Mundo?

Obviamente que estava a contar ir ao Mundial. Era um sonho que tinha. Participar num Mundial significa muito para os jogadores, porque é a competição mais importante que existe. Para mim, é especialmente doloroso ficar de fora, porque estive presente em toda a fase de qualificação, desde o arranque até ao dia da suspensão. É uma situação que tenho de saber enfrentar.

A explicação do seleccionador Óscar Tabárez convenceu-o?

Não sei... Mas não me interessa. Ainda sou novo, tenho 24 anos e uma carreira longa pela frente, e o futebol dá muitas voltas, pelo que estou convencido de que estarei no próximo Campeonato do Mundo.

O que sentiu quando soube que não tinha sido convocado?

Amargura, tristeza... os meus amigos, família a até alguns jornalistas uruguaios achavam que ia estar no Mundial. Eu também pensava que ia, porque fui titular durante toda a fase de qualificação, e por isto tudo fiquei surpreendido quando vi a convocatória. Mas amo a selecção, quero o melhor para todos os meus companheiros e se não estou lá, estará outro. Como joguei sempre na fase de qualificação, penso que vou fazer falta e que alguma coisa vai ter de mudar na forma de jogar da equipa, mas temos um excelente treinador, com muita experiência, e que vai dar a volta à situação.

A forma como se comportou no final do jogo com a Argentina, que acabaria por resultar na expulsão e castigo de quatro jogos, foi o maior erro da sua carreira?

Sem dúvida que foi o maior erro da minha carreira, mas também é preciso dizer que não matei ninguém. Esteve muita gente envolvida naquela confusão e, por isso, continuo sem perceber porque fui castigado. Para além disso, acho que os quatro jogos são um absurdo, porque nunca tinha tido um problema disciplinar na minha carreira. No passado também tinha havido casos similares, como o do Chilavert, por exemplo: ele também foi castigado com quatro jogos e depois acabaram por lhe reduzir a pena para dois para ele jogar no Mundial. Não concordo com o castigo que me foi aplicado, é exagerado. E há mais: o árbitro terá visto a minha agressão, mas não viu que fui agredido antes. Ou seja, limitei-me a defender do que me tinham feito.




Pedro Marques Costa e António Soares n' O Jogo.

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