sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Olho por olho

MUITOS benfiquistas nunca aceitaram o facto de o FC Porto ter melhores equipas, treinadores e organização. Não se conformaram com os novos tempos, em que deixaram de poder contar com o beneplácito político e com o monopólio do poder futebolístico. Para eles, a cada vitória do FC Porto nas competições domésticas, seguia-se a auto-vitimização e a insinuação, em forma de chorrilho fedorento. Nem os feitos europeus e mundiais do clube calaram essa maledicência. Tudo isso levou, aliás, a uma ruptura com a tradição. É que lembro-me da minha infância e da forma como nós, portistas, vibrávamos com as façanhas europeias do Benfica, e as sentíamos não direi como nossas, mas com orgulho por haver um clube português capaz de ombrear com os melhores. Pelo contrário, quando o FC Porto atingiu esse patamar, os seus sucessos foram apoucados e relativizados. O jornal do Benfica sugeria, há dias, que teria havido batota no Manchester United-FC Porto de 2004.
À custa de recordarem a sua história gloriosa, e entretidos a denegrirem os méritos alheios, as sucessivas direcções benfiquistas foram adiando as reformas de que o clube precisava. Para eles, a culpa pelos insucessos próprios e pelos sucessos do FC Porto sempre foi atenuada por fantasiosos factores externos, pelo sistema, pelo túnel das Antas, pelo desinfectante do balneário, pelo guarda Abel. Criou-se, assim, entre os benfiquistas, uma mitologia estranha, em que o passado era branqueado e o presente ia sendo desconstruído. Todos os anos, no Verão, garantiam que «desta vez é que vai ser» mas, chegada a Primavera seguinte, a desilusão era mascarada pelos habituais queixumes, enquanto os plantéis iam sendo dizimados. Ora, em termos meramente desportivos, este negacionismo benfiquista foi útil para perpetuar o domínio do FC Porto.

Este ano, o Benfica reapareceu com um projecto ousado, antecipando receitas vindouras e congregando novos investidores. É uma aposta de risco, mas à custa disso, tem uma equipa muito mais competitiva do que no passado recente e com um treinador apostado, também, em garantir, muito cedo na época, um improvável apuro de forma que mobilizou os seus adeptos. No Dragão, onde nem tudo vai bem depois do realismo das contas ter levado à saída de alguns dos melhores jogadores, a ascensão do adversário é vista com apreensão. E, como o Benfica vai contando, também, com os favores da arbitragem e dos ratos de secretaria, os portistas tem todo o direito, perante a evidência de que as cartas estão marcadas, de não esquecer o passado e de pagar aos encarnados com as moedas que estes cunharam. Bem podem os benfiquistas fazer-se, agora, de virgens ofendidas. Têm sido eles os mestres da suspeita. Mas, para ganhar o campeonato, não bastará reclamar. O FC Porto vai ter de ser, como sempre, melhor, muito melhor que o seu adversário.


A lei de 'Spock'
A provocação no túnel da Luz é indiscutível. Aliás, até Rui Costa por lá apareceu para pôr cobro à situação. Nada justifica agressões que, como já disse, são um caso de polícia, mas espanta-me que alguns moralistas não queiram ver onde esteve o rastilho e aplaudam a preguiça do processo. Será que um pontapé num túnel vale uma pena exemplar, quando o pontapé de Luisão a um adversário caído, e que aconteceu em pleno jogo e à vista de todos, só merece um cartão amarelo? Será por certo por este Luisão ser benfiquista e não faltará quem garanta que, ele sim, foi provocado... No fundo, os Spocks têm medo e não confiam na sua equipa. Se assim não fosse, não precisavam deste handicap.

O terrorismo
FOI terrível o que sucedeu em Angola com a selecção do Togo. Mesmo assim, a CAN vai ser um sucesso, e os angolanos não são os culpados. Quem se lembra de Munique sabe bem que a cobardia encontra sempre, no desporto, um dos seus alvos favoritos. Acredito que o torneio vai ser exemplar, que tudo vai correr como estava previsto, que a organização vai exceder as expectativas, que o povo vai vibrar. Para todos aqueles que desculpam o terrorismo, e em Portugal há quem defenda a FLEC, a ETA, as FARC e o Hezbollah e tente encontrar razões para o que não tem explicação e para justificar o que não tem desculpa, ficará mais este caso lamentável a sujar-lhes a consciência.

Para recordar
«VERIFICA-SE um estado de espírito geral de apoio incondicional ao Benfica», «há uma guerra fria cuidadosamente desenvolvida contra o Porto pelos meios de comunicação social de Lisboa», disse Pedroto. Tudo continua como dantes. O andor, e a aleivosia despudorada. Aplaude-se a actuação do CD da Liga, como se esta fosse um trunfo desportivo. Condenam-se os jogadores do FC Porto por uma acusação que eles não conhecem. Aceita-se que sejam, agora também, alvos de um processo por violação do segredo de justiça, quando já foram julgados pela opinião pública que conhece os factos que lhes são imputados através deste jornal. Vinte e cinco anos depois, o panorama não mudou.

Rui Moreira n' A Bola.

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