POR razões de elementar bom senso, não assisti ao espectáculo televisivo do Senhor Doutor Ricardo Costa. Dizem-me que a melhor forma de lidar com exibicionistas é não olhar, virar as costas e continuar a andar.
Não fiquei surpreendido que com o seu pouco convincente lavar de mãos, ao tentar invocar leis e regulamentos para explicar o inexplicável. Como aqui escrevi, logo que o caso foi conhecido, e não tive de esperar pelas doutas opiniões que entretanto se conhecem e apontam no mesmo sentido, nada na lei diz que os assistentes de recinto desportivo são agentes desportivos. Bem pelo contrário, e não apenas pela natureza das suas funções, mas também porque são funcionários escolhidos pelo clube organizador, que nem sequer estão sob a alçada da justiça desportiva.
O problema não está pois na lei, por imperfeita que ela seja: está na forma como a CD da Liga a interpreta, como se comprovará em sede de recurso. Se assim não fosse, estaria criado um perigoso precedente, e todos podemos imaginar o que aconteceria, doravante, nos túneis. Se um steward não se limitasse a provocar, a fazer ameaças, a criar enormes confusões e a causar a queda de pessoas, como comprovadamente aconteceu na Luz, e partisse para a agressão a um atleta, o que sucederia então?
Acho bem que se punam os jogadores que prevaricaram, mas conhecida a prova — e foram precisas 120 páginas para concluir que os stewards estavam lá para provocar desde início e, apesar de alertados até por Rui Costa, foram eles que deram causa a tudo — fiquei a perceber que, para a CD da Liga, qualquer arruaceiro contratado para steward deve ser protegido como se fosse árbitro ou dirigente, mesmo quando estava num local que lhe era vedado e onde nada tinha que fazer.
Aliás, e por falar em arruaceiros, recordo que os responsáveis da empresa de segurança que tem contrato com o Benfica garantiram que os seus funcionários «foram agredidos no correcto desempenho das suas funções». Não é isso que se lê no acórdão. Será que a Prosegur apenas tentou branquear a actuação dos seus funcionários, ou acreditará que a actuação deles foi a correcta? E colaborou ou consentiu com o que se passou no túnel? Neste caso em que já há um Pilatos, a empresa, licenciada para tarefas tão sensíveis como a segurança dos aeroportos, deveria dar um esclarecimento inequívoco.
Toda esta cena não causa estranheza a quem conhece os antecedentes do palavroso justiceiro. Não admira, sequer, que tenha tantos adeptos e defensores, facilmente conotados com um clube que quer ganhar na secretaria, e que agora aparecem com textos encomendados em que tentam fazer passar opiniões alheias como se fossem o texto da lei. O que não conseguem evitar, com essa defesa, é que muita gente pense que, como Luís Sobral escreveu, doravante «a Comissão Disciplinar poderá sempre ser acusada de ter contribuído para decidir o campeão em 2009/10».
Os batoteiros
DURANTE a semana, houve um coro afinado a sugerir que o FC Porto iria facilitar a vida ao Sp. Braga. Ignoravam que o FC Porto não reside no Estoril, que é um clube exigente e tem jogadores bravos que sabem muito bem o que está a acontecer. Por isso, empenharam-se em responder à insídia, vencendo uma partida bem disputada contra outro candidato ao título. Se o Braga perdeu com honra, os batoteiros foram rotundamente derrotados com o ruir da sua tese da santa aliança. Aliás, a fragilidade dos batoteiros é a de imaginarem que os outros precisam dessa arma. É por isso que, acabado o jogo, logo viraram as armas da insídia para Domingos, insinuando que fez um frete ao FC Porto.
'Scripts' alternativos
A mesma gente que encobriu e branqueou o Estorilgate, que achava que o FC Porto iria facilitar a vida aos bracarenses, finge agora acreditar que Domingos foi ao Dragão para ajudar o FC Porto. Pouco lhes importa se o jogo foi bom ou foi mau, se os jogadores tiveram mérito, se o Braga estava condicionado pelos castigos do justiceiro. Nada disso é relevante. No fundo, já tinham dois scripts alternativos. Se o Braga ganhasse, diriam que o FC Porto facilitara. Como o FC Porto ganhou, dirão que foi o Braga que não se empenhou. Pelo caminho, tentam achincalhar Domingos Paciência que os irrita particularmente, por ser um homem sério, honesto e humilde, mas que não esquece as suas origens.
A toupeira
SEGUNDO a enciclopédia, as toupeiras são animais mamíferos e peludos que vivem no subsolo, enterrados em tocas e galerias. Alimentam-se de minhocas da terra, e complementam esta dieta com insectos e com as suas larvas. Não têm orelhas externas e, devido ao seu modo de vida, são total ou parcialmente cegas. As toupeiras são uma praga, porque danificam os relvados com os túneis que escavam. No futebol doméstico, este é o ano da toupeira. Estamos no ano da cegueira selectiva, no ano dos túneis escavados que danificam os relvados e que condicionam o que lá se desenrola. O futebol português precisa, urgentemente, de uma fumigação intensiva, que o livre desta terrível praga.
A moral de Vata
Écerto que o livre indirecto de Ruben Micael, que resultou em golo contra o Arsenal, ficará nos anais da Liga dos Campeões. O jogador aproveitou, e bem, a situação, e foi por isso que aqui escrevi que foi esperto. Pois o Senhor Cruz dos Santos, que tem toda a razão quando refere que o árbitro não aplicou a recomendação ao não dar tempo para a formação da barreira mas não consegue dizer que o golo foi ilegal, não terá gostado do que escrevi e, sob o título «Esperteza ou deslealdade?», explica que, para ele, esperteza é sempre deslealdade. Deveremos, então, concluir que a lealdade é incompatível com a esperteza? É uma questão que, por respeito à pessoa em causa, me dispenso de analisar.
Rui Moreira n' A Bola.
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