1 - Como sabemos e todos os dias nos repetem, vai para aí uma terrível crise, que ataca as economias das famílias portuguesas. Bem, nem tanto assim ou nem todas. A Euribor desceu acentuadamente e, com ela, desceram as taxas de juro que a população mais endividada do mundo paga mensalmente aos bancos; a gasolina começou a descer também (embora apenas uma pequena parte do que deveria descer, se houvesse transparência no mercado). E, com isso, parece que há por aí muitos portugueses oficialmente em crise, que já se esqueceram outra vez das preocupações: as viagens para o Brasil estão esgotadas até Janeiro e os bilhetes já custam a inacreditável quantia de dois mil euros!
Não admira que também Gilberto Madail e o seu homólogo da CBF tenham pensado em conjunto montar também uma excursão ao Brasil. Juntos, encheram um avião de vedetas de ambos os lados do Atlântico, que têm em comum o facto de quase todas estarem expatriadas na Europa milionária do futebol. Foi um voo histórico: talvez nunca um só avião tenha transportado uma carga humana tão valiosa. Afora essa curiosidade histórica e as sempre bem-vindas receitas para duas federações que se habituaram a viver no luxo, não consigo descortinar uma única vantagem nesta excursão de Novembro ao Brasil.
Como se sabe, o negócio das federações é feito toda à custa do esforço extra dos jogadores e, sobretudo, dos clubes que lhes pagam. Há qualquer coisa de «chulice» institucional neste negócio dos jogos particulares organizados para dar receita às federações. Compreendo, evidentemente, que se façam jogos de preparação antes das grandes competições — o Europeu e o Mundial — e que, de vez em quando, se faça um outro jogo dito «de apresentação». Mas aproveitar todos os buracos e buraquinhos do calendário competitivo dos clubes para encaixar jogos a feijões da Selecção Nacional é apenas um abuso de coisa alheia. Já Scolari — que, para justificar o ordenado de luxo da federação e os milhentos contratos publicitários que adorava, tinha de reunir a Selecção pelo menos uma vez por mês — confessava, todavia, que a única preparação que interessava era a que decorria nas duas ou três semanas anteriores às fases finais das competições, quando tinha os jogadores à sua disposição o tempo suficiente para treinar rotinas e esquemas de jogo. Agora, fazer um jogo de preparação com as Ilhas Feroé, dois meses depois outro com o Brasil, dois meses depois outro com as Bahamas, dois meses depois outro com a Itália, não serve para nada, rigorosamente. Só para prejudicar os clubes e cansar as vedetas.
O Brasil-Portugal, jogado a meio de uma semana de competições nacionais e entre competições europeias, num subúrbio de Brasília e num relvado que nem se sabia se iria estar em condições, foi uma excursão inútil e um desastre desportivo. Uma humilhação para todos nós, como era de prever, excepto para o Miguel Veloso, que não viu motivos para tal.
Repare-se, por exemplo, no caso de Danny, a mais recente aquisição da Selecção. Na penúltima jornada do campeonato russo, jogou em São Petersburgo, no domingo, dia 16; a 17, no dia seguinte, viajou para Lisboa, provavelmente via Frankfurt e talvez também com escala em Moscovo — um mínimo de oito horas de viagem, entre voos e aeroportos; nessa mesma noite, embarcou para um voo de dez horas até Brasília, saindo de uma temperatura de alguns dez graus negativos para as temperaturas do Verão brasileiro, a rondar os 35; no dia seguinte, treinou-se em Brasília e na noite seguinte, quarta-feira, a uma hora que para ele equivalia às 4 da manhã em S. Petersburgo, jogou contra o Brasil e até marcou o golo inaugural; terminado o jogo, seguiu-se hora e meia de autocarro e embarque para Lisboa, em novo voo de dez horas; desembarcado em Lisboa ao meio-dia de 5.ª feira, ei-lo a reembarcar para S. Petersburgo, via Frankfurt: mais oito horas de viagem, até chegar a casa, depois de ter percorrido 23 mil quilómetros em quatro dias; sexta-feira, acorda em S. Petersburgo e voa para Moscovo, onde, no dia seguinte, joga os 90 minutos no último e decisivo jogo do campeonato contra o Dínamo, em que o seu clube, o Zenit, disputava o 5.º lugar e a participação na Taça UEFA do próximo ano (o Zenit ganhou e Danny marcou dois golos e assistiu o terceiro); seguiu-se novo voo de regresso a S. Petersburgo e, enfim, o descanso. Imagine-se o entusiasmo com que ele irá receber no futuro novas convocatórias para jogos destes...
2 - Se todos, brasileiros e portugueses, tinham razões para acusar cansaço, desmotivação e poupança, um houve que foi o pior em campo e não por essa razão: Cristiano Ronaldo. O homem que já virou griffe e que se faz tratar por CR7, perdeu-se no jogo apenas por culpa do vedetismo e vaidade de que vem dando mostras, em crescente descontrolo. Quando lhe perguntaram se era o melhor jogador do mundo e ele respondeu que era «o primeiro, o segundo e o terceiro», quando lhe perguntaram se era mais bonito que o Kaká e ele respondeu «gosto de mim», quando foi substituído no sábado, em Inglaterra, depois de mais uma exibição completamente apagada, e saiu com o dedo espetado a indicar que era o n.º 1, já dá para perceber que aquele rapaz precisa urgentemente de quem lhe explique coisas básicas sobre a vida e a maneira de estar no futebol, como em tudo o resto. Em Brasília, ele não se perdeu por cansaço nem por falta de talento: perdeu-se por falta de humildade, incapacidade de pensar na equipa e não apenas em si próprio, parecendo uma barata tonta às voltas com fintas falhadas e rodriguinhos sem sentido para impressionar as meninas da plateia. O problema de se querer ser vedeta todos os dias é que não se pode falhar dia nenhum... Ele é o número 1 do mundo? Ponha os olhos no Messi ou no Ibrahimovic e vai ver que não. Ou então, que alguém o ponha a ver os vídeos de um senhor chamado Eusébio da Silva Ferreira, que ganhava um centésimo do que ele ganha, jogava bem mais do que ele e era capaz de chorar depois de perder um jogo pela Selecção.
3 - Dei comigo, durante o Brasil-Portugal de triste memoria, a contar os ex-jogadores do FC Porto que actuavam pelos dois lados. Eram onze, uma equipa inteira! Quatro pelo Brasil — Thiago Silva, Diego, Anderson e Luís Fabiano — e sete por Portugal — Bosingwa, Pepe, Paulo Ferreira, Deco, Maniche, César Peixoto e Hugo Almeida. Por aqui se pode ver a dimensão do património que o FC Porto tem delapidado nos últimos anos.
4 -Já não há saco para aguentar as eternas lamúrias dos sportinguistas contra as arbitragens, ainda para mais sem ponta de razão. Parece que, no espírito de um sportinguista, basta que um árbitro apite qualquer coisa contra o Sporting para já ser suspeito. Como toda a gente viu e comentou, Paulo Bento, mais uma vez, não teve a menor razão para se queixar da arbitragem de Artur Soares Dias, na Figueira da Foz. Na minha opinião, trata-se até, provavelmente, do melhor árbitro português do momento e, seguramente, muito melhor árbitro do que Paulo Bento é treinador. Com que legitimidade é que Paulo Bento acha que se pode permitir pôr em causa a seriedade dele? Tem algum mandado divino para decidir que não é penalty quando toda a gente viu que era? Ou tem andado a almoçar com o dr. Dias da Cunha e está contagiado pela asneira livre? Ele que ponha os olhos no Domingos Paciência, que interrogado sobre o penalty a favor do Benfica que resolveu o jogo em Coimbra — e quando já todos tínhamos visto que resultara de uma simulação de Reyes que enganou o árbitro — se limitou a dizer que estava longe de mais para poder ter visto em condições. Mais vale perder como um gentleman do que ganhar como um Dias da Cunha.
5- Olho para aqueles meninos dos No Name Boys e para o extenso rol das suas actividades «desportivas» e só espero que ninguém mais venha falar da selvajaria dos adeptos portistas — um dos mitos que alimentam as crónicas lisboetas desde há muito.
Miguel Sousa Tavares n' A Bola
Não admira que também Gilberto Madail e o seu homólogo da CBF tenham pensado em conjunto montar também uma excursão ao Brasil. Juntos, encheram um avião de vedetas de ambos os lados do Atlântico, que têm em comum o facto de quase todas estarem expatriadas na Europa milionária do futebol. Foi um voo histórico: talvez nunca um só avião tenha transportado uma carga humana tão valiosa. Afora essa curiosidade histórica e as sempre bem-vindas receitas para duas federações que se habituaram a viver no luxo, não consigo descortinar uma única vantagem nesta excursão de Novembro ao Brasil.
Como se sabe, o negócio das federações é feito toda à custa do esforço extra dos jogadores e, sobretudo, dos clubes que lhes pagam. Há qualquer coisa de «chulice» institucional neste negócio dos jogos particulares organizados para dar receita às federações. Compreendo, evidentemente, que se façam jogos de preparação antes das grandes competições — o Europeu e o Mundial — e que, de vez em quando, se faça um outro jogo dito «de apresentação». Mas aproveitar todos os buracos e buraquinhos do calendário competitivo dos clubes para encaixar jogos a feijões da Selecção Nacional é apenas um abuso de coisa alheia. Já Scolari — que, para justificar o ordenado de luxo da federação e os milhentos contratos publicitários que adorava, tinha de reunir a Selecção pelo menos uma vez por mês — confessava, todavia, que a única preparação que interessava era a que decorria nas duas ou três semanas anteriores às fases finais das competições, quando tinha os jogadores à sua disposição o tempo suficiente para treinar rotinas e esquemas de jogo. Agora, fazer um jogo de preparação com as Ilhas Feroé, dois meses depois outro com o Brasil, dois meses depois outro com as Bahamas, dois meses depois outro com a Itália, não serve para nada, rigorosamente. Só para prejudicar os clubes e cansar as vedetas.
O Brasil-Portugal, jogado a meio de uma semana de competições nacionais e entre competições europeias, num subúrbio de Brasília e num relvado que nem se sabia se iria estar em condições, foi uma excursão inútil e um desastre desportivo. Uma humilhação para todos nós, como era de prever, excepto para o Miguel Veloso, que não viu motivos para tal.
Repare-se, por exemplo, no caso de Danny, a mais recente aquisição da Selecção. Na penúltima jornada do campeonato russo, jogou em São Petersburgo, no domingo, dia 16; a 17, no dia seguinte, viajou para Lisboa, provavelmente via Frankfurt e talvez também com escala em Moscovo — um mínimo de oito horas de viagem, entre voos e aeroportos; nessa mesma noite, embarcou para um voo de dez horas até Brasília, saindo de uma temperatura de alguns dez graus negativos para as temperaturas do Verão brasileiro, a rondar os 35; no dia seguinte, treinou-se em Brasília e na noite seguinte, quarta-feira, a uma hora que para ele equivalia às 4 da manhã em S. Petersburgo, jogou contra o Brasil e até marcou o golo inaugural; terminado o jogo, seguiu-se hora e meia de autocarro e embarque para Lisboa, em novo voo de dez horas; desembarcado em Lisboa ao meio-dia de 5.ª feira, ei-lo a reembarcar para S. Petersburgo, via Frankfurt: mais oito horas de viagem, até chegar a casa, depois de ter percorrido 23 mil quilómetros em quatro dias; sexta-feira, acorda em S. Petersburgo e voa para Moscovo, onde, no dia seguinte, joga os 90 minutos no último e decisivo jogo do campeonato contra o Dínamo, em que o seu clube, o Zenit, disputava o 5.º lugar e a participação na Taça UEFA do próximo ano (o Zenit ganhou e Danny marcou dois golos e assistiu o terceiro); seguiu-se novo voo de regresso a S. Petersburgo e, enfim, o descanso. Imagine-se o entusiasmo com que ele irá receber no futuro novas convocatórias para jogos destes...
2 - Se todos, brasileiros e portugueses, tinham razões para acusar cansaço, desmotivação e poupança, um houve que foi o pior em campo e não por essa razão: Cristiano Ronaldo. O homem que já virou griffe e que se faz tratar por CR7, perdeu-se no jogo apenas por culpa do vedetismo e vaidade de que vem dando mostras, em crescente descontrolo. Quando lhe perguntaram se era o melhor jogador do mundo e ele respondeu que era «o primeiro, o segundo e o terceiro», quando lhe perguntaram se era mais bonito que o Kaká e ele respondeu «gosto de mim», quando foi substituído no sábado, em Inglaterra, depois de mais uma exibição completamente apagada, e saiu com o dedo espetado a indicar que era o n.º 1, já dá para perceber que aquele rapaz precisa urgentemente de quem lhe explique coisas básicas sobre a vida e a maneira de estar no futebol, como em tudo o resto. Em Brasília, ele não se perdeu por cansaço nem por falta de talento: perdeu-se por falta de humildade, incapacidade de pensar na equipa e não apenas em si próprio, parecendo uma barata tonta às voltas com fintas falhadas e rodriguinhos sem sentido para impressionar as meninas da plateia. O problema de se querer ser vedeta todos os dias é que não se pode falhar dia nenhum... Ele é o número 1 do mundo? Ponha os olhos no Messi ou no Ibrahimovic e vai ver que não. Ou então, que alguém o ponha a ver os vídeos de um senhor chamado Eusébio da Silva Ferreira, que ganhava um centésimo do que ele ganha, jogava bem mais do que ele e era capaz de chorar depois de perder um jogo pela Selecção.
3 - Dei comigo, durante o Brasil-Portugal de triste memoria, a contar os ex-jogadores do FC Porto que actuavam pelos dois lados. Eram onze, uma equipa inteira! Quatro pelo Brasil — Thiago Silva, Diego, Anderson e Luís Fabiano — e sete por Portugal — Bosingwa, Pepe, Paulo Ferreira, Deco, Maniche, César Peixoto e Hugo Almeida. Por aqui se pode ver a dimensão do património que o FC Porto tem delapidado nos últimos anos.
4 -Já não há saco para aguentar as eternas lamúrias dos sportinguistas contra as arbitragens, ainda para mais sem ponta de razão. Parece que, no espírito de um sportinguista, basta que um árbitro apite qualquer coisa contra o Sporting para já ser suspeito. Como toda a gente viu e comentou, Paulo Bento, mais uma vez, não teve a menor razão para se queixar da arbitragem de Artur Soares Dias, na Figueira da Foz. Na minha opinião, trata-se até, provavelmente, do melhor árbitro português do momento e, seguramente, muito melhor árbitro do que Paulo Bento é treinador. Com que legitimidade é que Paulo Bento acha que se pode permitir pôr em causa a seriedade dele? Tem algum mandado divino para decidir que não é penalty quando toda a gente viu que era? Ou tem andado a almoçar com o dr. Dias da Cunha e está contagiado pela asneira livre? Ele que ponha os olhos no Domingos Paciência, que interrogado sobre o penalty a favor do Benfica que resolveu o jogo em Coimbra — e quando já todos tínhamos visto que resultara de uma simulação de Reyes que enganou o árbitro — se limitou a dizer que estava longe de mais para poder ter visto em condições. Mais vale perder como um gentleman do que ganhar como um Dias da Cunha.
5- Olho para aqueles meninos dos No Name Boys e para o extenso rol das suas actividades «desportivas» e só espero que ninguém mais venha falar da selvajaria dos adeptos portistas — um dos mitos que alimentam as crónicas lisboetas desde há muito.
Miguel Sousa Tavares n' A Bola
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